Num artigo que envolve temas de saúde pública, com a emergência de nova doença , com aspectos preocupantes, é oportuno fazer dois registros iniciais.
O primeiro diz respeito ao fato de que, embora se trate aqui de possíveis impactos econômicos decorrentes dessa nova doença, o mais relevante a lamentar e a mencionar é indiscutivelmente a perda de vidas humanas já ocorridas por conta do novo corona virus e aquela que ainda deverá ocorrer com essa epidemia. Isso não tem preço e nenhum analista econômica pode ignorar.
Em segundo lugar, é importante antecipar que ainda é cedo para se empreender uma razoável avaliação dos possíveis impactos nas economia mundial e brasileira, e suas repercussões no plano setorial, e aqui o que mais interessa é a repercussão no nosso agronegócio, particularmente nas exportações para a China, nosso maior importador ( com cerca de 34% de nossas vendas externas setoriais), e para o resto do mundo. Cabe destacar inclusive que a análise da SARS, ocorrida a partir da China em 2002/2003, e que vitimou cerca de 800 pessoas, não serve muito para nossa abordagem aqui porque a nova epidemia, a despeito da menor letalidade, já suplantou a SARS em número de óbitos. Ademais, dita análise da SARS se referiu a uma &e acute;po ca em que a economia chinesa não tinha a importância que tem atualmente. A China detinha um participação de 5% da economia mundial em 2002 e hoje essa parcela já foi aproximadamente triplicada.
Quanto à economia, além dos efeitos nada desprezíveis na atividade turística internacional , de lazer e de negócios, com o cancelamento de viagens e voos para a China e as restrições do governo chinês ´para a saída de seus compatriotas do país e mesmo internamente, no comércio e serviços dentro dessa grande nação asiática, as especulações iniciais parecem apontar para uma epidemia mais agressiva concentrada no primeiro trimestre deste ano, com repercussões na desaceleração do crescimento da economia chinesa , e redução das suas exportações e importações, afetando, desse modo, as exportações brasileiras para este nosso g rande pa rceiro comercial. Nesse cenário, a indústria nacional sofreria certo grau de falta de insumos importados, e o agronegócio poderia ser afetado, mas em menor intensidade que outros setores. Alguns analistas estimam que a taxa de crescimento da economia chinesa poderia recuar para um patamar ao redor de 5,4% 5,5% este ano, bem abaixo das previsões no patamar de 6% ou mais, como tem sido o padrão histórico.
No atual momento , já se observa queda de preços de algumas commodities importantes de nossa economia, como soja, petróleo e minério de ferro. É de se ressaltar, de mais a mais, que essa epidemia adiciona mais um ingrediente de incerteza ao agronegócio brasileiro , somando-se ao acordo comercial da China com os EUA firmado recentemente , que prevê compras preferenciais chinesas de produtos agropecuários norte-americanos, com potencial de eventualmente deslocar parte de nossas vendas externas setoriais para o mercado chinês.
Do lado do Brasil, o governo adota postura de dispensar um tratamento cortês ao governo do país asiático, chamando inclusive o Embaixador chinês para um reunião com nosso Ministro da Saúde, para se inteirar de nossas providências de resgate dos brasileiros do epicentro da epidemia, resgate que se consumou hoje com chegada dos dois aviões da FAB em Anápolis. A ministra Tereza Cristina tem tido um papel ativo junto ao citado embaixador, que tem confirmado que o relacionamento Brasil/China no campo do agronegócio é duradouro e cada vez mais estreito.
Ainda do lado brasileiro, a meta é manter e ampliar nossa fatia no mercado agropecuário chinês , inclusive diversificando a pauta, incluindo a abertura recente para nossas exportações de melão e estudos para abrir o mercado para as uvas brasileiras. Quem sabe, no futuro, outras fruteiras possam ganhar espaços em negociações com os chineses. Outros países asiáticos e do Oriente Médio têm de estar no nosso “radar”.
Em outra frente, temos de manter a vigilância sanitária vegetal e animal, para evitar novos episódios similares ao da chamada Operação Carne Fraca, que provocou desconfiança de nossos importadores. Nesse particular, consideramos prematuro implantar a proposta de autocontrole, ventilada pelo Ministério da Agricultura. Voltaremos a esse tema mais a frente.
Finalmente, cabe atentar para as indicações do Ministério da Agricultura e para a Organização Internacional de Saúde Animal , no sentido de que não há registro de ocorrência de qualquer tipo de corona virus em qualquer espécie animal no mundo, e que , portanto, não ha motivos para restringir o comércio agropecuário internacional. De todo , teremos de estar atentos ao cenário da doença do novo corona virus nas próximas semanas.
(1) Consultor Legislativo e doutor em Economia pela USP. E-mail: [email protected]