

A colunista Gillian Tett, em artigo para o jornal inglês Financial Times, afirmou nesta sexta-feira (28) que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva venceu a ofensiva tarifária do presidente dos EUA, Donald Trump, após meses de tensão diplomática envolvendo a taxação de produtos brasileiros.
Logo no início da análise, Tett ironiza a reversão das tarifas extras anunciadas por Trump em agosto, que elevaram a taxação sobre produtos brasileiros para 50%. “Como se diz ‘TACO’ — no sentido de ‘Trump Always Chickens Out’ (“Trump sempre amarela”, em tradução livre) — em português?”, escreve, sugerindo que muitos brasileiros agora fariam a provocação “com um sorriso”.
A sigla ‘TACO’, que resume a expressão Trump Always Chickens Out, ganhou força por meio de memes após os Estados Unidos imporem novas sanções ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e a aproximação do início do tarifaço contra produtos brasileiros. Usuários brasileiros adaptaram o apelido para ironizar a postura agressiva do presidente americano, sugerindo que, mais uma vez, ele poderia acabar voltando atrás.
Na semana passada, os Estados Unidos retiraram a tarifa extra sobre mais de 200 produtos brasileiros, incluindo café, carne bovina, cacau e frutas. A decisão amplia a lista de exceções ao tarifaço e ocorreu após reunião entre Mauro Vieira e o secretário de Estado americano, Marco Rubio. Na semana anterior, os EUA já haviam reduzido tarifas de cerca de 200 itens alimentícios; agora, com a nova medida, vários produtos brasileiros retornam às taxas normais anteriores ao aumento.
À época, Trump justificou o tarifaço como uma resposta a ações do governo brasileiro que, segundo a Casa Branca, ameaçariam a segurança nacional americana. Segundo o artigo do Financial Times, Lula respondeu “de forma desafiadora” às ameaças, o que acabou fortalecendo sua imagem interna. “Em bom português: Lula venceu”, afirmou a colunista.
As lições para outros países
Na visão da colunista, há três lições principais no episódio. A primeira, segundo ela, é que a Casa Branca está mais sensível à pressão do custo de vida. “Pesquisas recentes mostram que a confiança dos consumidores está caindo junto com a popularidade de Trump”, lembra Tett, destacando que reduzir tarifas agrícolas tornou-se um gesto politicamente conveniente.
A segunda lição, diz ela, é que “valentões geralmente respondem à força”. Países como China já demonstraram isso, e o Brasil teria seguido o mesmo caminho. Segundo ela, a conclusão é a de que quem lida com Trump precisa avaliar “como explorar seus pontos fracos”. A terceira lição, segundo a colunista, destaca ainda a importância de separar táticas de objetivos ao analisar a Casa Branca. Para Tett, isso nem sempre é intuitivo, já que Trump frequentemente parece agir sem uma estratégia claramente definida.
Sua postura em relação ao Brasil, à Ucrânia e até ao caso Jeffrey Epstein, entre outros episódios, tem sido tão “errática” que, afirma Tett, a imprevisibilidade se tornou sua única característica previsível. Ela lembra que, assim como em seus negócios, Trump usa táticas agressivas — “bullying, ameaças, melodrama, mudanças bruscas de política, favoritismo e anúncios para ‘inundar a zona’”, citando o ex-estrategista Steve Bannon.
Essas ações, porém, devem ser vistas como táticas, não como objetivos permanentes: “O objetivo é obter vantagem sobre os rivais em um mundo transacional”.Tett afirma que recuos como o das tarifas brasileiras fazem parte de um padrão. Para ela, esses “movimentos melodramáticos” são apenas táticas, não objetivos reais, o que permite à Casa Branca mudar de rumo “sem constrangimento”.
Ela lembra que a guinada pró-Brasil ocorreu na mesma semana em que Trump também se reaproximou do prefeito de Nova York, Zohran Mamdani. O presidente americano, que chegou a chamar Mamdani de “comunista” ao anunciar a reunião, também surpreendeu ao mudar totalmente o tom e garantiu que irá ajudar o prefeito a tirar do papel alguns de seus projetos, como a criação de moradias acessíveis.
Ao final do artigo, Tett admite que alguns podem ver sua análise como uma tentativa de “racionalizar” um governo marcado por imprevisibilidade. “Eu não negaria a natureza caprichosa de Trump”, diz. Ainda assim, reforça a mensagem central: separar o “sinal” do “ruído” é essencial para entender o comportamento da Casa Branca. E, no caso brasileiro, Lula enviou um sinal importante. “Reis raramente são tão todo-poderosos quanto parecem”, conclui a colunista.
Foto: Ricardo Stuckert/PR