O interesse da China pelos negócios no Brasil está entrando em uma nova fase. Se antes os chineses investiam principalmente em infraestrutura e energia e, mais recentemente, trouxeram ao país montadoras de veículos elétricos como BYD e GWM, agora a ofensiva chegou aos serviços, de olho no apetite de consumo dos brasileiros, do e-commerce ao sorvete. O crescimento acelerado do comércio eletrônico no Brasil atraiu a Libiao, multinacional de automação chinesa que opera em mais de 35 países e chegou ao mercado nacional no mês passado. A empresa atua na infraestrutura logística de operadoras de e-commerce, com robôs capazes de agilizar a gestão de produtos e encomendas em centros de distribuição.
O Brasil é uma porta de entrada da Libiao para a América Latina, explica Thiago Holanda, gerente de Desenvolvimento de Negócios da chinesa para a região. — O Brasil é o maior mercado de e-commerce da América Latina, e isso demanda soluções de automação que reduzem prazos de entrega. Houve um aumento de custo de espaços logísticos, por conta do incremento da demanda. Além disso, o Brasil tem um baixo nível de automação, o que indica potencial de crescimento — diz o executivo, que também cita a escassez de mão de obra, maior em datas comerciais como Black Friday e Natal.
Em maio de 2025, a gigante chinesa de fast-food Mixue — cuja rede já é maior que McDonald’s, Starbucks, Subway e KFC — anunciou investimento de R$ 3,2 bilhões no Brasil. Abriu seu primeiro ponto de vendas em um shopping paulistano e quer crescer aqui por meio de franquias, lucrando com a venda de suprimentos. Planeja instalar uma fábrica no país e usar ingredientes locais, repetindo o modelo original de distribuição integrada.
Criada por dois irmãos, a Mixue começou vendendo raspadinhas em carrinhos nas ruas chinesas. Hoje, tem sorvetes, limonadas e bebidas com chá cremoso, frutas e as famosas “bubbles” (bolinhas de sagu) com preços em torno de US$ 1 (R$ 5,50). Seu sorvete é 40% mais barato que um premium. O aporte bilionário foi anunciado em maio, na visita do presidente Lula à China, quando executivos da Mixue estimaram gerar 25 mil empregos até 2030 no Brasil.
Especialistas afirmam que o maior interesse da China pelo Brasil pode ser impulsionado pela guerra comercial aberta pelo presidente dos EUA, Donald Trump, que força os chineses a direcionar excedentes de produção para outros países. Ampliar a presença no grande mercado consumidor brasileiro faz sentido diante da dificuldade de Pequim de estimular seu mercado interno. — O chinês consome muito, mas produz mais — diz Roberto Dumas, professor de Economia Internacional do Insper. — Pequim busca incluir o Brasil na sua zona de influência com recursos financeiros.
Cariello, do CEBC, observa que a China mantém investimentos constantes em energia no Brasil, o principal destino de capital chinês no país, com expansão recente em fontes renováveis. Também avança na mineração de estanho, cobre e ferro-ligas. No entanto, Vivian Fraga, sócia e especialista em China do TozziniFreire Advogados, verifica que os aportes chineses no Brasil, neste momento, estão mais orientados para tecnologia e consumo digital. Ao mesmo tempo, a resistência a produtos chineses, há pouco tempo vistos como de qualidade inferior, diminui entre os consumidores brasileiros. — Conforme a China vem se sofisticando, o mercado passou a ver esses produtos de outra forma. O brasileiro quer qualidade, mas também bom preço — diz a especialista.(O Globo)
Foto: Divulgação / Libiao