O sistema Ferry Boat de Salvador carece de atenção. Segundo reportagem do Jornal A Tarde, o tempo de espera e a deterioração dos equipamentos estão entre as maiores queixas dos usuários do sistema. Em média, cerca de 20 mil passageiros e 3 mil veículos utilizam o serviço de travessia marítima diariamente. Na última segunda-feira, mais uma vez problemas técnicos causaram atrasos no sistema. Um deles fez com que passageiros tivessem de esperar mais de cinco horas para conseguir desembarcar.
A situação também reverbera economicamente. Para quem depende diretamente do ferry-boat para atividades comerciais, como o vendedor João Carmo Silva, de 36 anos, que transporta mercadorias de Salvador para a ilha, o prejuízo é imediato. “Cada hora que passamos na fila é uma hora a menos de trabalho e de ganho”, pondera em entrevista ao Jornal A Tarde. Há também grandes prejuízos indiretos. Todo o comércio e os setores imobiliário e de serviços da ilha há muito sofrem com as intercorrências no ferry, que vão gradativamente afastando visitantes – e tornando os negócios economicamente inviáveis.
Não é preciso andar muito por Itaparica para perceber que parte considerável de restaurantes, bares, pousadas e barracas de praia não conseguiu voltar às atividades no pós-pandemia. Para se ter uma ideia da demanda reprimida pelo gargalo no ferry, o governo estima que o fluxo de veículos na ponte hoje, caso ela já existisse, seria de entre 25 e 30 mil veículos por dia. “Existe o lobby da Ponte Salvador–Itaparica, mas se esquece que a ponte não vai ficar pronta da noite para o dia – e enquanto isso, a população fica nesse suplício”, argumenta o professor da Escola Politécnica da Universidade Federal da Bahia (Ufba) José Lázaro de Carvalho.
A própria Internacional Travessias, que administra o sistema, aponta o gargalo provocado pela falta de embarcações como entrave para o modal. Em nota, a operadora lembrou que quando assumiu a operação do ferry-boat, em 2014, havia nove embarcações à disposição dos passageiros. Hoje, há sete no sistema – das quais apenas cinco estão em condições operacionais.
“O estudo de demanda foi previsto no processo licitatório, quando o sistema possuía nove embarcações em operação, levando em consideração que os ferries precisam passar por manutenções corretivas, preventivas e ciclos operacionais de vistorias obrigatórias anuais realizadas pela Sociedade Classificadora”, informa a empresa.
Pelo contrato de concessão do sistema, cabe ao Estado fazer a reposição da frota – o que, para alguns estudiosos, é um erro. “Esse tipo de contrato é outro problema, porque a empresa não é dona da frota”, avalia o arquiteto e professor Paulo Ormindo Daniel de Azevedo. “Quando um ferry quebra, pegam hélice e motor de outro (para consertar). Fazem as embarcações de almoxarifado umas das outras e, em pouco tempo, está tudo sucateado. Não faz sentido a empresa ser só operadora, tem de rever todo o sistema.”
O governo baiano chegou a abrir um processo de compra de uma nova embarcação para o sistema. Como A TARDE noticiou nos últimos meses, porém, a aquisição, além de insuficiente, foi travada por burocracias e disputas “pouco democráticas” de interesses de políticos do Estado. Agora, o governo avalia a compra de duas embarcações, para ao menos tentar repor a frota do sistema de uma década atrás. Ainda não há data definida para essas aquisições, porém.
Foto: Camila Souza/GOVBA