O Brasil registrou um resultado líquido negativo de US$ 21,08 bilhões no acumulado dos quatro primeiros meses do ano devido uma forte saída de dólares pela via financeira entre janeiro e abril, segundo dados do Banco Central. Esse foi o segundo pior fluxo financeiro do país registrado no período desde o início da série histórica do BC, iniciada em 1982, atrás apenas de 2020. No primeiro quadrimestre daquele ano, marcado pela eclosão da pandemia de Covid, houve saída líquida de US$ 32,52 bilhões pela conta financeira.
O fluxo financeiro está relacionado à entrada e saída de dólares no mercado de capitais, com operações referentes a, por exemplo, investimentos em títulos, remessas de lucros e dividendos no exterior e investimentos estrangeiros diretos. O fluxo financeiro vem desacelerando desde 2022 – ao analisar os dados acumulados em 12 meses – e, neste ano, a saída de dólares pela via financeira foi puxada pelo desinvestimento na Bolsa brasileira.
A queda é reflexo da decisão de uma parcela do mercado de migrar seus investimentos para economias mais “seguras”, como os Estados Unidos, onde há mais estabilidade e as taxas de juros seguem atrativas. Em maio, o Fed (Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos) decidiu manter os juros entre 5,25% e 5,5%, o nível mais alto em 23 anos. A autoridade monetária também sinalizou que as taxas devem permanecer mais elevadas por mais tempo, enquanto o país lida com uma inflação persistente.
A política monetária americana tem reflexos significativos nos mercados financeiros globais, especialmente em economias emergentes como o Brasil. Aqui, o Copom (Comitê de Política Monetária) do BC vem reduzindo os juros desde agosto do ano passado e, na última quarta-feira (8), levou a taxa básica (Selic) a 10,50% ao ano após um corte de 0,25 ponto percentual em decisão dividida.
Questões domésticas, como a política fiscal, também acabam trazendo maior aversão a risco para o investidor estrangeiro. Nesse contexto de grande incerteza, ela vê o investidor tirando seus recursos da bolsa e levando para fundos de investimento e para a renda fixa em busca de mais segurança. Em abril, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) propôs uma revisão na trajetória das contas públicas, com meta fiscal zero também para 2025, não mais 0,5% do PIB (Produto Interno Bruto).
No dia seguinte ao anúncio, a moeda americana chegou a bater R$ 5,281, o maior valor em mais de um ano, com a piora na percepção dos economistas. Também pressionava o dólar a expectativa de um adiamento do corte de juros nos EUA para o segundo semestre e as tensões do conflito geopolítico no Oriente Médio. Naquele momento, o BC não fez intervenções no mercado para controlar a volatilidade cambial.
Segundo o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, a autoridade monetária não atua quando os agentes econômicos reprecificam o risco de investir no Brasil e essa função é usada em casos de disfunção no mercado, lacuna de liquidez ou episódios mal-interpretados pelos investidores.
“Não reagimos ao fato de as pessoas estarem reprecificando nosso prêmio de risco. Reagir a isso é muito perigoso porque há muitas maneiras diferentes de fazer hedge [instrumento de proteção] do prêmio de risco no Brasil”, disse.
“Se o governo fosse intervir muito pesadamente no câmbio, o que se veria é que a ponta longa das taxas explodiria porque as pessoas procurariam maneiras diferentes de fazer hedge”, acrescentou.
Nesta quarta (15), Campos Neto voltou a alertar para a piora no prêmio de risco ao comentar a deterioração do cenário doméstico nas últimas semanas, o que levou uma ala do Copom a defender a desaceleração do corte de juros, decisão que acabou prevalecendo.
“O prêmio de risco estava piorando quando olhamos algumas variáveis importantes de prêmio de risco na parte longa da curva, como as NTN-Bs [Notas do Tesouro Nacional Série B]”, disse o chefe da autarquia na conferência anual do BC.