Quando Arly completou 70 anos escrevi o seguinte texto, com o mesmo título acima:
“Em dezembro de 1944 Archimedes e Lyrandina chegaram em Ruy Barbosa com seus três filhos nascidos em Saúde: Jamildo Ary, Adary e Jamary. Chovia muito nesse dia e tudo indicava que mais uma seca seria interrompida, como foi. Alugaram uma casa na Praça Castro Cincurá (hoje Adalberto Sampaio) e lá ficaram por quase um ano, o suficiente para assistirem as comemorações do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, com o povo cantarolando “vitória, vitória, o Brasil venceu a guerra…”. Em 1946 nasceu Arquimedes Filho, o primeiro ruibarbosense da família. Antes de se mudarem para a casa construída na Rua Nova (hoje Demétrio Ribeiro),no final de 1947, estiveram na casa das três mangueiras da Praça Santa Teresa, vizinha da Usina de Luz, e na Rua Formosa.
Archimedes e seu irmão Glicério, casado com Adelina, fundaram uma microempresa que comercializava produtos da região. Comprava mamona, pó de palha, ouricuri, feijão, milho, fumo (tabaco), couro de bovinos e caprinos e os revendia em Salvador, transportando-os em caminhões pelas rodovias de chão batido, ou em vagões da Leste pela estrada de ferro. O negócio prosperou com rapidez o que permitiu a Archimedes construir a casa com recursos próprios e a Glicério mudar-se para Salvador.
Arly nasceu no dia 13 de dezembro de 1948, há 70 anos. Chovia a chuva de trovoada comum na região nos meses de novembro e dezembro e Archimedes teve de enfrentar o aguaceiro para ir até a Rua do Curral chamar a Dona Messias, famosa parteira da região. Seu nome foi formado pelas duas primeiras letras dos pais e deu sequência aos nomes terminados em y dos Oliveira. A casa de Lyrandina e Archimedes ficou em festa, nascera a primeira menina filha do casal. A Rua Nova, que levava este nome por ser formada apenas por casas recém construídas, ficou mais alegre.
Arly viu nascer mais dois irmãos, Oltair e Amauri. Oltair faleceu prematuramente pouco antes de completar um ano de idade. Amauri em 1954, quando ela já havia completadoquatro anos e Ary e Adary já estavam cursando o ginásio nos Maristas, em Salvador. A maior festa de aniversário que a Rua Nova conheceu foi do primeiro ano de Arly. Lyrandina passou meses preparando as fantasias azuis das bonecas rosas que seriam entregues de lembrança a cada um dos convidados. Não faltaram bombons, bolos de chocolate, manjar dos céus, chocolate quente, pirulitos, brigadeiros, etc.
Antes de ir para Salvador, estudar no colégio das Mercês, Arly foi tratada com muito carinho pelos pais, pela avó Eulália e pelos cinco irmãos. Não os acompanhava nos jogos de bola, na brincadeira de picula, nas partidas de pá e cambito, nem empinava arraia ou suruco,mas participava das cantigas de roda, das amarelinhas, do jogo de capitão, e assistia as mais animadas fogueiras de São João, com galhos de árvores enfeitadascompresentes e as queimas de judas preparadas por sua mãe e seus irmãos. Eram as melhores festas do gênero do bairro, conhecidas por toda a cidade. Também não faltava às partidas de futebol do Flamengo local, estava sempre presente nos batuques de Cosme e Damião, acompanhava os Bumba-meu-boi, comboiava os Reisados, assistia aos espetáculos dos Circos que transitavam pela região e nunca deixou de ir a uma Micareta no Clube Social, que seu pai ajudou a fundar e a construir.
As outras meninas da Rua Nova eram contagiadas pela alegria radiante que ela transmitia(Ana Lúcia, Laurinda, Verbena, Gardênia, Silene, Neuza, Marita, Norma,Neide, Leda, Dalva, Regina, Vera, Dalise, Dilase) e ficaram suas amigas para sempre. A história de Arly, do tempo das Mercês até os dias de hoje, tem várias versões. Cada um de seus amigos é dono de uma delas, cada uma mais alegre do que outra. É melhor, daqui em diante, cada um escrever, ou imaginar, a sua. Os seus filhos (Mário, João e Maria) e seus netos sabem compor histórias divertidas e recheadas de aventuras da mulher que se divertiu na vida como ninguém e soube ultrapassar com sabedoria todas as adversidades que se apresentaram em seu caminho. Venceu com serenidade a todas. Seus 70 anos merecem uma linda e honrosa comemoração”.
Ontem (15/07), Arly faleceu, deixando todos tristes, principalmente seu companheiro Carlos. Os sinos da igreja de Ruy Barbosa retumbaram anunciando seu passamento e a eternização de sua alegria. Que Deus a guarde. Nós, aqui da Terra, continuaremos reverenciando as coisas lindas que nos ensinou.
Adary Oliveira é engenheiro químico e professor (Dr.) – [email protected]