O italiano Luiggi Piccolo passeava pelo cemitério de Corsier-sur-Vevey, na Suíça, quando notou algo estranho no túmulo do famoso ator e diretor Charles Chaplin.
“Cheguei lá e vi a sepultura vazia. Achei que podia estar no túmulo errado e procurei por todo o cemitério. Mas estranhei as marcas no chão, como se algo tivesse sido arrastado. Foi quando decidi alertar o encarregado local”, contou o visitante, que, diante da reação do funcionário, entendeu o tamanho do escândalo que ele havia descoberto.
Gênio da comédia no cinema mudo, consagrado por filmes como “O grande ditador” e “Em busca do ouro”, Chaplin morreu aos 88 anos, após sofrer um derrame cerebral enquanto dormia, na manhã do Natal de 1977. Pouco mais de dois meses depois, no dia 1° de março, há exatos 45 anos, criminosos desenterraram e roubaram o caixão do artista com o corpo dele dentro. De acordo com a imprensa da época, o sarcófago era feito de carvalho, pesava 90 kg e estava a 1,40 metro da superfície.
Dois dias após o crime, a pacata cidade, com então cerca de 25 mil habitantes, havia se transformado. O roubo do corpo de um dos artistas mais conhecidos do século XX se tornara notícia no mundo todo. Dezenas de jornalistas percorriam as ruas de Vevey em busca de informações sobre o ocorrido, e centenas de curiosos chegavam de ônibus para ver de perto o túmulo profanado, que rapidamente ficou cheio de flores depositadas ali pelos visitantes.
Chaplin morava em Vevey desde 1952 e era querido pela comunidade. O repórter Cláudio Kuck, correspondente do GLOBO, esteve nos jardins da mansão onde ele vivia e conversou com a secretária da família, Monica de Montet. Ela garantiu que os criminosos ainda não haviam entrado em contato. Em entrevista ao jornal “Daily Express”, a viúva, Oona Chaplin, com quem o comediante teve oito filhos, afirmou que não pagaria resgate de jeito nenhum. “Quem em seu juízo perfeito pagaria por uma pessoa, mesmo amada, que já está morta? Chaplin teria achado essa ideia absurda”.
O corpo e os ladrões só foram localizados mais de dois meses depois. No dia 17 de maio, a polícia suíça informou que havia prendido um polonês de 24 anos e um búlgaro de 38 anos. Roman Wardas e Gantscho Ganev confessaram o crime e levaram os investigadores até o milharal, a 40 quilômetros do cemitério, onde eles haviam enterrado o cadáver de Chaplin. Chegando lá, a dupla não soube apontar o local exato, e foi necessário o uso de detectores de minas e sondas para encontrar o alaúde.
Wardas e Ganev decidiram sequestrar o corpo após ler notícia sobre um crime parecido na Itália. Com duas pás, eles levaram duas horas para desenterrar o caixão e levá-lo até uma caminhonete. Depois, passaram a telefonar para a família exigindo resgate. A viúva deixou que a polícia tomasse conta das negociações. Eles chegaram a combinar a entrega de dinheiro duas vezes, mas nada aconteceu. Na terceira tentativa, os investigadores localizaram o sequestrador enquanto ele combinava a extorsão numa cabine telefônica em Vevey.
Durante o julgamento, Wardas contou que deixou a Polônia para melhorar de vida, mas não conseguira emprego na Suíça. “Decidi esconder o corpo de Charles Chaplin para resolver meus problemas de dinheiro”, contou ele no tribunal. Em busca de ajuda, o imigrante procurou o amigo Ganev, que aceitou participar achando que os riscos eram mínimos. “Levantar o caixão não me incomodou. A morte não é tão importante no lugar de onde venho”, disse ele, que ficou surpreso com a repercussão do crime.
Wardas, que portanto admitiu ter sido o arquiteto do sequestro, foi condenado a quatro anos e meio de trabalhos forçados. Ganev, que ajudou a desenterrar e esconder o cadáver, mas não participou da extorsão, foi sentenciado a 18 meses de “prisão suspensa”. Ou seja, ele foi obrigado a observar certas determinações judiciais para não ir para a cadeia nesse período. Já o corpo de Chaplin foi enterrado no mesmo local de antes, mas com uma tampa de concreto na superfície sobre o túmulo.
Fonte: g1
Foto: Reprodução