Em entrevista, a advogada tributarista PatrÃcia Gaudenzi explica sobre a proposta de emenda da Constituição (PEC) que traz medidas para reduzir o preço dos combustÃveis e deve ser votada na próxima semana
- O Congresso Nacional aprovou projeto de lei complementar que reduz o ICMS dos combustÃveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo para uma alÃquota máxima de 17%. Aguarda-se agora a sanção presidencial. Qual a razão desta alteração?
O governo federal vem dando sinais de pressão pelo cumprimento de algumas demandas antigas e que são sensÃveis a toda a população e não apenas a algum setor. É o caso desses itens alterados no projeto de lei complementar, que afetam não apenas as famÃlias, mas impactam indiretamente quase todos os setores econômicos porque dizem respeito ao custo de produção, escoamento ou distribuição de bens e serviços, e que fazem parte da composição do Ãndice de inflação. Por isso, a tentativa é de atingir os preços a partir do imposto que mais pesa na sua definição. Mas cabe uma crÃtica jurÃdica pelo fato de que o ICMS não é um imposto com finalidade extrafiscal, como o IOF e o IPI.
- Por que esses impostos não foram então considerados no projeto?
O IOF incide sobre operações financeiras, então não geraria o impacto desejado de reduzir os preços desses itens. Já o IPI incide em quase todos eles porque são produtos industrializados, mas a cobrança desse imposto não é tão relevante para o preço final porque suas alÃquotas são muito inferiores ao percentual de ICMS. Aliás, mesmo a redução do PIS, da COFINS e da CIDE, que são contribuições que também incidem sobre os combustÃveis, o resultado poderia não ser alcançado. Como a redução precisa ser significativa para gerar o efeito desejado, os esforços se concentram no ICMS, mesmo sendo um imposto estadual e não federal.
- Sendo o ICMS um imposto estadual, não caberia aos Estados definir essas alÃquotas?
Essencialmente, sim. Mas o projeto atribui caráter essencial a esses itens, facultando a aplicação de alÃquotas reduzidas, já que se trata de tributo seletivo em que as alÃquotas variam para menos sempre que os bens sejam essenciais para a sociedade. Então, ao atribuir o caráter essencial a esses bens, o Congresso Federal passa a permitir a limitação da cobrança, embora a perda financeira da diminuição de receita tributária seja sempre do Estado e não da União.
- Haverá impacto nos orçamentos dos Estados então, mesmo sendo um projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional?
Exatamente! Por isso vem-se falando em uma compensação financeira por parte da União se a perda de arrecadação dos Estados for maior que 5%. E aà novamente entramos numa discussão semelhante à que tratamos em matéria de reforma tributária, na qual o poder de tributar da União – ou de interferir na tributação, como neste caso – é ampliado em contrapartida à diminuição do poder tributário dos Estados, mas com compensações financeiras condicionadas. Daà pode nascer um preocupante cenário de dependência fiscal entre Estados e União.
- Pode-se esperar que o novo imposto possa nem mesmo ser sentido no bolso do consumidor?
Essa é a maior preocupação. Mesmo com a redução do ICMS para combustÃveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo, as empresas não estão obrigadas a reduzir o preço final.
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