Em entrevista, a advogada tributarista Patrícia Gaudenzi explica sobre a proposta de emenda da Constituição (PEC) que traz medidas para reduzir o preço dos combustíveis e deve ser votada na próxima semana
O governo federal vem dando sinais de pressão pelo cumprimento de algumas demandas antigas e que são sensíveis a toda a população e não apenas a algum setor. É o caso desses itens alterados no projeto de lei complementar, que afetam não apenas as famílias, mas impactam indiretamente quase todos os setores econômicos porque dizem respeito ao custo de produção, escoamento ou distribuição de bens e serviços, e que fazem parte da composição do índice de inflação. Por isso, a tentativa é de atingir os preços a partir do imposto que mais pesa na sua definição. Mas cabe uma crítica jurídica pelo fato de que o ICMS não é um imposto com finalidade extrafiscal, como o IOF e o IPI.
O IOF incide sobre operações financeiras, então não geraria o impacto desejado de reduzir os preços desses itens. Já o IPI incide em quase todos eles porque são produtos industrializados, mas a cobrança desse imposto não é tão relevante para o preço final porque suas alíquotas são muito inferiores ao percentual de ICMS. Aliás, mesmo a redução do PIS, da COFINS e da CIDE, que são contribuições que também incidem sobre os combustíveis, o resultado poderia não ser alcançado. Como a redução precisa ser significativa para gerar o efeito desejado, os esforços se concentram no ICMS, mesmo sendo um imposto estadual e não federal.
Essencialmente, sim. Mas o projeto atribui caráter essencial a esses itens, facultando a aplicação de alíquotas reduzidas, já que se trata de tributo seletivo em que as alíquotas variam para menos sempre que os bens sejam essenciais para a sociedade. Então, ao atribuir o caráter essencial a esses bens, o Congresso Federal passa a permitir a limitação da cobrança, embora a perda financeira da diminuição de receita tributária seja sempre do Estado e não da União.
Exatamente! Por isso vem-se falando em uma compensação financeira por parte da União se a perda de arrecadação dos Estados for maior que 5%. E aí novamente entramos numa discussão semelhante à que tratamos em matéria de reforma tributária, na qual o poder de tributar da União – ou de interferir na tributação, como neste caso – é ampliado em contrapartida à diminuição do poder tributário dos Estados, mas com compensações financeiras condicionadas. Daí pode nascer um preocupante cenário de dependência fiscal entre Estados e União.
Essa é a maior preocupação. Mesmo com a redução do ICMS para combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte coletivo, as empresas não estão obrigadas a reduzir o preço final.
Foto: divulgação