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SUBSTÂNCIA CANCERÍGENA CONTAMINOU ÁGUA DE SETE CIDADES

Redação - 12/03/2022 08:40 - Atualizado 12/03/2022

A água que usamos para tomar banho e cozinhar é potável. Em teoria, sempre será própria para uso. Mas, uma pesquisa do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua), do Ministério da Saúde, a partir de dados sobre a qualidade do líquido consumido pelos baianos entre os anos de 2018 e 2020, aponta que em sete de 196 cidades do estado, surgiram índices acima do permitido de substâncias cancerígenas pelo menos uma vez, o que representa 3,5% do total de municípios testados.

O maior responsável pela contaminação é um componente gerado no próprio tratamento do recurso hídrico. As cidades de Camaçari, Cruz das Almas, Itabuna, Itiruçu, Jequié, Lauro de Freitas e Vitória da Conquista foram as sete dentre as listadas no levantamento que apresentaram contaminação.  Os dados da pesquisa do Sisagua/MS foram compilados pelo Mapa da Água, da Agência Repórter Brasil e cedidos ao Correio. A cada quatro cidades do país onde foram realizados os testes, uma, ao menos, teve como resultado água contaminada.

Em Cruz das Almas, somente dois testes de qualidade foram realizados e os dois identificaram água imprópria. Em Itiruçu, de dois, um teste foi reprovado. Nas cidades da Região Metropolitana de Salvador, dois dos 14 testes feitos em Lauro de Freitas foram reprovados. Já em Camaçari, a testagem foi muito maior, do total de 3.677, apenas um identificou água contaminada. A quantidade de testes segue a frequência definida de acordo com o tamanho da população abastecida, segundo a Embasa.

Em Itabuna, 33 das 2.085 amostras foram reprovadas. Na cidade de Vitória da Conquista, duas das 275 amostras estavam contaminadas. Já em Jequié, um do total de 247 amostras teve as substâncias tóxicas encontradas acima do limite. Em seis das sete cidades, os componentes encontrados acima do patamar de segurança foram os ácidos haloacéticos. Classificados como subprodutos da desinfecção da água, os haloacéticos  são formados quando o cloro é adicionado ao tratamento. Os ácidos são seguros desde que mantidos abaixo da concentração recomendada pelo Ministério da Saúde.

Roberto Márcio Souza, mestre em química analítica ambiental e professor da UniRuy Wyden, explica que o cloro evita que bactérias e protozoários nocivos à saúde humana se desenvolvam na água. “O cloro é um agente oxidante que vai impedir que microrganismos se desenvolvam por um período. Embora seja essa sua função, podem existir reações paralelas indesejáveis nos processos físicos e químicos para tentar retirar substâncias poluentes prejudiciais à saúde”, diz.

O professor Roberto Márcio destaca que é necessário que exista um controle constante de todos os parâmetros possíveis, incluindo os que dizem respeito às reações paralelas, durante o processo de tratamento, para evitar que as substâncias apareçam em quantidade acima do permitido. Para o professor, a legislação brasileira deveria ser mais severa em relação a isso.

Ele também alerta que os danos para os seres humanos vão depender dos efeitos cumulativos das substâncias e do organismo de cada pessoa. “Têm pessoas que já possuem problemas hepáticos, por exemplo, então existe uma série de incógnitas em relação a isso”, acrescenta.  A Agência Nacional de Pesquisa em Câncer da Organização Mundial da Saúde (OMS), classifica os ácidos haloacéticos como potencialmente cancerígenos para os humanos. Se consumidos em altas concentrações, podem gerar problemas no fígado, testículos, pâncreas, cérebro e sistema nervoso.

Fabrício Tourinho, gerente de controle da água e efluentes da Empresa Baiana de Água e Saneamento (Embasa), que faz o tratamento hídrico no estado, afirma que períodos de muita chuva entre os anos analisados podem ter sido responsáveis pela concentração de substâncias acima do permissível. Segundo ele, as amostras reprovadas nos testes são pontuais e não são suficientes para classificar a água como imprópria para o consumo.

“Em algumas épocas do ano de mais chuva, a natureza acaba jogando mais nutriente e matéria orgânica nas captações de água. Esta matéria orgânica chegando na estação em quantidade maior, faz com que se precise aumentar a quantidade de cloro a ser utilizada, o que tende a formar mais subprodutos”, explica. Diferente dos outros municípios, Camaçari apresentou nitrito em excesso na água potável. Segundo Fabrício Tourinho, esse componente é encontrado quando o recurso captado sofre poluição humana. “Ele aparece na água geralmente quando há associação por contaminação com fontes externas à base de nitrogênio, como lançamento de esgoto. A presença dele sinaliza que a água está próxima de uma área de contaminação”, diz.

Em nota, a Embasa afirmou que realizou 34.500 análises de amostras de água no período contemplado pela pesquisa do Sinagua e que apenas 0,1% delas estavam em não conformidade com a legislação estabelecida. Enquanto as análises federal e estadual divergem, moradores das cidades afetadas ficam sem saber se a água que consomem é segura. O estudante de Engenharia da Computação Raphael Souza mora em Lauro de Freitas e ficou assustado ao saber da pesquisa. “Ficamos sem saber se dá para confiar ou não”. Silvânia Oliveira, fotógrafa que mora em Cruz das Almas, afirma que se preocupa apesar de não ter notado diferença na água que consome. “Infelizmente é uma notícia muito ruim, chega a ser algo muito preocupante para a nossa saúde no futuro”, diz.

A reportagem entrou em contato com as sete cidades baianas apontadas no estudo. A prefeitura de Jequié informou que deve agendar reunião com a diretoria regional da Embasa, através da Secretaria de Agricultura, Irrigação e Meio Ambiente (Seagri). A gestão de Vitória da Conquista informou apenas que solicitou esclarecimentos da companhia responsável pelo tratamento da água.  A prefeitura de Cruz das Almas disse que vai notificar a Embasa para ter explicações sobre o ocorrido. Camaçari, Itabuna, Itiruçu e Lauro de Freitas não deram retorno até a publicação desta reportagem. Municípios de outros estados tiveram resultados piores do que na Bahia. Em Guarulhos (SP) por exemplo, foram sete componentes encontrados.

Foto: divulgação

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