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ENTENDA MAIS SOBRE AS CONSEQUÊNCIAS DAS SANÇÕES CONTRA RUSSIA

Redação - 02/03/2022 10:00 - Atualizado 02/03/2022

Após a invasão da Ucrânia pela Rússia, na quinta-feira (24), muitos países, liderados pelo governo dos Estados Unidos e pela União Europeia (UE), anunciaram sanções internacionais contra o país liderado por Vladimir Putin. De forma geral, essas medidas visam isolar a Rússia do mercado global, controlar de forma rigorosa a exportação e impactar diretamente o acesso do país à tecnologia de ponta.

“As sanções funcionam como grandes barreiras para reduzir o fluxo de comércio com os parceiros da Rússia. O objetivo econômico é fazer com que a Rússia perca espaço no ambiente internacional”, explica Juliana Inhasz, professora de economia do Insper. Do outro lado, a Rússia adotou uma série de medidas para reagir às sanções e tentar proteger o rublo, sua moeda, e afastar a ameaça de implosão do sistema financeiro do país.

Como funcionam essas sanções?

Na prática, as sanções têm o objetivo de enfraquecer a economia russa. Assim, o país fica com menos dinheiro para comprar armas e arsenal para continuar a guerra. Estados Unidos e UE pretendem fazer isso interrompendo as transações econômicas com bancos e empresas russas. Do lado dos EUA, também entram o corte da conexão do sistema financeiro do país com a maior instituição financeira da Rússia, o Sberbank, incluindo 25 subsidiárias.

Os impedimentos às transações com o Banco Central russo têm efeito de bloquear os recursos desse banco – o BC russo mantêm fortes reservas no exterior. Assim, ele não consegue mexer no dinheiro que tem fora da Rússia, explica Roberto Dumas, professor de economia internacional do Insper.

“O Banco Central russo tem US$ 630 bilhões de reserva internacional. Provavelmente, vai ter dois terços investidos em títulos públicos dos Estados Unidos, países da Europa, Japão. Mas o dinheiro está preso, a Rússia não consegue usar”, explica Dumas.

Quais são as consequências para a Rússia?

Sem acesso ao dinheiro “preso”, a moeda da Rússia o rublo, vai perdendo valor. E, com países parando de comprar produtos russos ou vender para o país, as negociações vão diminuindo. E isso tem o potencial de jogar a economia russa numa crise profunda, em que a produção e o consumo vão minguando – por falta de insumos para produzir, e de recursos para comprar.

“Isso reduz a entrada de dinheiro, dificulta a saída e entrada de produtos e faz com que a Rússia perca espaço e dinheiro junto às negociações com o Ocidente”, afirma Inhasz. Para a economista, a exclusão das instituições russas do sistema Swift é o mais forte bloqueio, porque trava qualquer tipo de negociação e possibilidade de que o dinheiro chegue ao país.

Para Walter Franco, professor de macroeconomia no Ibmec, no curto prazo, as sanções têm um objetivo mais político de forçar a Rússia a negociar com a Ucrânia para o fim da guerra. Porém, se isso não acontecer, no médio e longo prazo, o cenário piora muito. “Se a guerra continuar, as sanções econômicas terão potencial devastador para o PIB, para a geração de emprego, de renda e para o comércio internacional russo. Aí você cessa o processo de investimento no país e começa a comprometer a economia de forma mais profunda”, diz.

O que as sanções podem provocar para outros países?

Inhasz diz que, indiretamente, existe um efeito para o mundo inteiro. A Europa, por exemplo, depende do gás que a Rússia vende e vai precisar encontrar outro parceiro comercial. No início, isso pode gerar um desabastecimento. “Ainda que não gere desabastecimento, gera uma redução de oferta e os preços tendem a subir. A gente deve ver, ao longo das próximas semanas, esse aumento de preço acontecendo no petróleo e seus derivados, no gás natural e também produtos importantes da produção russa e ucraniana, como trigo, milho e fertilizantes”, alerta a economista.

Para conter a inflação de combustíveis e alimentos, os bancos centrais do mundo inteiro vão responder com aumento da taxa de juros, analisa Dumas. Isso pode prejudicar o crescimento econômico das economias que já estão abaladas por dois anos de pandemia. “A grana sai de todos os países e vai para os Estados Unidos via dólar. Isso tem impacto inflacionário em transações entre os países, que compram e vendem na moeda americana. O mundo cresce menos”, diz.

Por que a Rússia impede a saída de dólares?

A Rússia precisa impedir a saída de dólar porque quer conter a desvalorização da própria moeda – um rublo fraco torna cada vez mais difícil para o país comprar insumos do exterior. Quanto menos moeda estrangeira houver dentro do país, mais cara ela se torna em comparação com a moeda local.

Para isso, o governo proibiu o envio de dinheiro para o exterior a residentes russos e obrigou exportadores a converter em rublos 80% de sua receita em moeda estrangeira obtida desde 1º de janeiro. Com isso, ele busca diminuir a volatilidade do mercado, explica Franco. “A volatilidade é muito mais danosa ao mercado financeira, mais do que a queda ou subida de um ativo ou moeda.”

Quanto mais dólar sai da economia, mais as pessoas ficam desesperadas por dólar, diz Dumas. Isso leva a uma depreciação ainda maior do rublo. Com o rublo desvalorizado, o investidor que quiser comprar a moeda americana precisará pagar uma taxa mais alta por ela.

Por que a Rússia decidiu elevar a taxa de juros?

Justamente para conter a saída do dólar, a resposta do governo russo foi aumentar a taxa de juros. Com isso, ele torna o investimento em moeda russa mais atrativo porque paga mais para quem investe no país.

O cenário de guerra leva a uma corrida por dólar. “A pessoa fala para o banco: ‘quero US$ 10 mil’. Mas está acabando o caixa do banco em dólar e ele não consegue pegar mais por conta das sanções. Por isso, ele aumenta a taxa de juros e fala: ‘fica aqui em rublo porque vai ter um retorno maior’”, explica Dumas.

Para Inhasz, essas medidas serão pouco efetivas na prática, porque os riscos de investir na Rússia são muito altos e ninguém quer fazer isso. E acredita que, na prática, um “mercado paralelo de dólar” será criado pelas empresas exportadoras.

“Aumentar a taxa de juros agora é como colocar um band-aid em uma fratura exposta. O aumento da taxa de juros é pra conter essa saída de dólar. Mas é como investir um dinheiro que você não sabe se vai ser devolvido. O risco é elevadíssimo e ninguém vai querer colocar dinheiro em um lugar desses”, opina.

Foto: Anton Vaganov/Reuters

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