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LEI DO VENTRE LIVRE: PRÁ INGLÊS VER – POR ARMANDO AVENA

Redação - 02/10/2021 08:28 - Atualizado 04/10/2021

A Lei do Ventre Livre, que tornava livre os filhos da mulher escrava, está fazendo 150 anos. Não há o que comemorar, a lei foi uma empulhação. Mas a data tem o condão de trazer à lembrança a forma hipócrita com que as classes dominantes brasileiras trataram a questão. Desde meados do século XIX, o mundo civilizado abominava a escravidão. A Inglaterra queria espalhar o capitalismo pelo mundo e a escravidão não combinava com um sistema que pregava a livre-iniciativa.  Assim, a armada inglesa passou a atacar os navios negreiros. O que faz então as elites brasileiras frente a óbvia necessidade de abolir a escravidão? Resistem, com o famoso jeitinho brasileiro: criando leis inúteis para engabelar o povo.

A primeira dessas leis foi a Lei Eusébio de Queirós, de 1850, com a qual o governo, cedendo às pressões do Império Britânico, proibia o tráfico de escravos, afirmando que ali tinha início o fim da escravidão. A lei nunca foi cumprida e os negreiros brasileiros singravam o Atlântico sob o beneplácito do governo e de tal modo que o povo dizia que a lei era  “para inglês ver”, desmascarando a trapaça. Mas os tempos mudaram. Era 1871, fazia apenas 6 anos que os Estados Unidos, após uma guerra civil sangrenta, haviam aprovado a Décima Terceira Emenda à Constituição que abolia a escravidão em todo seu território. E a elite brasileira, que controlava o Parlamento, precisava dar uma satisfação ao povo, mas, ao invés de proceder a imediata  libertação de todos os escravos, um novo acordo é feito para que o fim a escravidão se desse  de forma lenta, gradual e segura, mantendo pelo maior tempo possível os privilégios dos senhores de escravos.  E então aprova-se a Lei do Ventre Livre, um arremedo de libertação, que libertava quem o futuro já havia tornado livre. A lei era uma grande tapeação.

Os filhos das escravas estariam livres, mas ficariam sob tutela do proprietário até completar oito anos de idade e após esse período, pasmem os leitores,  era o senhor de escravos que decidia se iria entregar a criança ao estado e ser indenizado ou se continuava explorando sua força de trabalho até a maioridade aos 21 anos. “Algo precisa mudar para tudo continuar como está”, diria Tancredi, em O Leopardo. Depois, em 1885, viria outra lei mentirosa, a Lei dos Sexagenários,  que libertava os velhos com mais de 60 anos mas, pasmem novamente os leitores, através de uma  indenização que deveria ser paga pelo próprio liberto, que, além disso, era  obrigado a prestar serviços ao seu ex-senhor por mais três anos ou até completar 65 anos de idade.

Os escravos raramente viviam mais de 65 anos e jamais teriam recursos para pagar a indenização. Era mais uma lei “para inglês ver”. Até 1988, e mais além, os políticos brasileiros protegeram os interesses dos senhores de escravos, empulhando  o Brasil, que entrou para a História  como o último país do ocidente  a acabar com a escravidão.

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