Todo ano é a mesma coisa. A professora aposentada Anete Dias, 75 anos, pega a muleta, entra no carro e vai até a agência bancária mais próxima do bairro dos Barris, onde ela mora, para provar que está viva. Pega a senha, aguarda na fila, encontra o gerente e entrega a documentação. O funcionário checa os dados, devolve os documentos, a idosa retoma as muletas e volta para casa. Por conta da pandemia, esse ritual foi interrompido no ano passado, mas desde junho o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) retomou o serviço de prova de vida, obrigatório para quem é aposentado ou pensionista. O prazo para fazer essa comprovação encerra em outubro, mas 483.875 baianos ainda não fizeram o procedimento. Quem não prova que está vivo tem o benefício bloqueado, depois suspenso e pode ser até cancelado.
Dona Anete, que fará a prova em outubro, disse que o procedimento é burocrático, mas defendeu a checagem. “Eu concordo porque já fui testemunha de um caso de fraude. Uma pessoa usava o cartão de outra pessoa, que tinha falecido, para retirar o benefício. Então, esse procedimento ajuda a evitar essas situações”, disse. Ela contou que a mãe dela foi aposentada pelo INSS e também fazia a comprovação, assim como um irmão dela que tinha Síndrome de Down e era beneficiário. Quando ele morreu a professora ouviu um conselho que nunca esqueceu. “Uma pessoa disse para a gente continuar sacando o dinheiro como se ele ainda estivesse vivo. Existe muita gente sem caráter nesse mundo”, afirmou.
Segundo o INSS, é para combater golpes como esse que a prova de vida existe. No ano passado, o procedimento não foi exigido, mas, mesmo assim, 418.657 baianos fizeram a comprovação. Este ano, mais 1.674.684 de pessoas procuraram as agências na Bahia e regularizaram a situação. Alguns bancos disponibilizaram o serviço de forma virtual para facilitar o procedimento e a estudante Maria Alice Souza, 31, aproveitou a oportunidade. “Minha tia precisava fazer a comprovação. Nos deram a opção de fazer presencial ou através de um aplicativo. Baixei o APP e fiz o procedimento. Ele pediu para fazer a leitura facial em vários ângulos, como por exemplo virar a cabeça para a direita, piscar duas vezes, olhar para cima etc. Por enquanto os dados dela estão atualizados e o banco não pediu para a gente comparecer no presencial”, disse.
Consequências
Desde junho, o Instituto voltou a exigir essa confirmação e para evitar aglomerações dividiu o público por datas. Até o dia 30 de setembro devem comparecer às agências os beneficiários que deveriam ter comprovado estar vivos em setembro ou outubro de 2020. No mês que vem, será a vez daqueles que deveriam ter ido às agências em novembro e dezembro do ano passado. Os beneficiários que deveriam ter comprovado estar vivo entre março e agosto de 2020 tiveram até agosto deste ano para procurar as agências. Quem perdeu o prazo pode ir ao banco regularizar a situação, mas até isso acontecer o benefício fica bloqueado. Caso o beneficiário não procure a agência bancária em até 30 dias, o pagamento fica suspenso e será necessário ir até uma agência do INSS para resolver.
O chefe da Divisão de Cadastro do Segurado Especial do INSS, Marcelo Caetano, não soube precisar quantos golpes esse tipo de procedimento conseguiu evitar, mas disse que a prova de vida é uma proteção para todos, tanto para os cofres público como também para o beneficiário. “É uma medida que protege o dinheiro público, mas também o segurado. Hoje, os cartórios informam os óbitos diariamente, então, situações de pessoas recebendo o benefício por alguém que já morreu são menos comuns. Mas existem casos de pessoas que se apossam dos cartões do beneficiário, sem procuração, e ficam com o pagamento. A prova de vida serve para resolver também essas questões”, contou.
Caetano disse que as agências bancárias têm autonomia para adotar as ferramentas que julgar mais adequadas, por isso, a recomendação do INSS é que o beneficiário entre em contato com o banco para saber quais serviços estão disponíveis. “Alguns estão oferecendo aplicativos, outros estão dando opção de fazer a prova de vida no caixa eletrônico, e tem aqueles que estão agendando horários específicos para atender exclusivamente esse público. É preciso checar com o seu banco”, disse. Todo aposentado ou pensionista precisa fazer a prova de vida pelo menos uma vez por ano. Pessoas com dificuldade de locomoção ou com mais de 80 anos podem solicitar o atendimento domiciliar. Outras dúvidas podem ser esclarecidas através do App Meu INSS ou do telefone 135.
Golpe
Uma investigação de fraude ao INSS levou equipes da Polícia Federal até dois endereços, em Camaçari e em Dias D’Ávila, na Região Metropolitana de Salvador, nesta quinta-feira (23). Eles cumpriram mandados de busca e apreensão contra duas pessoas suspeitas de criar falsos segurados para receber benefícios. Os bandidos usavam documentação falsa e contavam com a ajuda de idosos que fingiam ser os beneficiários. A ação é continuidade da Operação Heterônimo que levou às prisões, em junho deste ano, de duas pessoas em flagrante, no interior de uma agência bancária de Salvador, que tentavam sacar R$ 30 mil de um benefício fraudulento. Desta vez, uma arma foi apreendida. Os envolvidos vão ser processados por associação criminosa, estelionato previdenciário, falsificação de documento público e uso de documento falso. Somada, as penas podem chegar a mais de 25 anos de prisão. A investigação é realizada em conjunto pela Polícia Federal e a Coordenação-Geral de Inteligência Previdenciária e Trabalhista (CGINT) do Ministério do Trabalho e da Previdência.
Como fazer a prova de vida:
(Correio)
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