Mais da metade das cidades da Bahia não têm estrutura para voltar com as aulas semipresenciais até agosto, segundo um levantamento feito pela União dos Dirigentes Municipais de Educação da Bahia (Undime-BA), que obteve resposta de 415 das 417 prefeituras baianas. A pesquisa, que avaliou a rede escolar municipal, mostra que 215 municípios só voltarão a ter estudantes e professores em sala a partir de setembro de 2021. Outras 132 prefeituras – ou seja, quase um terço dos municípios baianos – disseram que só retornam em 2022.
O estudo da Undime-BA conclui, ainda, que apenas 68 cidades da Bahia estão preparadas para voltar até agosto, e somente dez delas ainda em julho de 2021. Das outras cidades que voltam ainda este ano, 110 cidades disseram que só o farão em setembro, 87 voltam em outubro, 14 em novembro e quatro somente em dezembro. As prefeituras afirmam que, além de muitas instituições de ensino estarem ainda em obras, outras não têm condições de se adaptar aos protocolos sanitários.
O prazo dentro do qual as escolas conseguem retomar as aulas semipresenciais é muito depois da data estipulada pelo governador da Bahia, Rui Costa (PT). Ele determinou que as aulas semipresenciais devem iniciar hoje para o Ensino Médio, Ensino Profissionalizante e Ensino de Jovens e Adultos (EJA), e no próximo dia 9 de agosto para o Ensino Fundamental II.
Segundo o presidente da Undime-BA, Raimundo Pereira, que também é vice-prefeito e secretário de Educação de Itaparica, na Região Metropolitana de Salvador (RMS), os 132 municípios que sinalizaram só voltar ano que vem estão revendo o planejamento inicial para conseguir retornar ainda esse ano com a modalidade híbrida. Mas, eles ainda não definiram sequer o mês de retorno.
“Nem todos os municípios estão no mesmo ritmo, essa é a grande questão. Cada um tem uma realidade, uma condição financeira diferente e o que a Undime defende é a autonomia do planejamento das prefeituras. No momento que foi feito o anúncio da volta às aulas, faltou diálogo para saber se os municípios estavam prontos e apenas 10 podem voltar em julho”, explica Pereira.
Arrecadação em baixa
Um dos motivos principais que acarretaram na falta de estrutura das escolas para receber os estudantes, segundo o presidente da Undime, foi a falta de planejamento financeiro das prefeituras, em meio à queda da arrecadação de impostos, maior fonte de receita. “Mais de 200 municípios tiveram mudança de gestão e as prefeituras estavam desestruturadas, pegaram o pico da pandemia e agora que começaram a fazer a programação do retorno das aulas”, afirma. Segundo dados da Transparência da Secretaria da Fazenda da Bahia (Sefaz-BA), as receitas totais dos municípios baianos caíram mais de R$ 2,2 milhões, o equivalente a 4,4% do total, de 2019 para 2020.
O transporte escolar também é um entrave, mas não tão determinante como a falta de infraestrutura. “O único município que não banca o transporte da rede estadual é Salvador, todos os outros municípios do interior são responsáveis por transportar os alunos do estado, que não assume a totalidade da despesa, sendo que praticamente 80% dos alunos transportados são da rede estadual e o governo não repassa nem metade do valor”, revela Pereira.
No caso de Itaparica, onde ele é secretário de Educação, as aulas só voltam em setembro, porque algumas escolas precisam concluir reformas. “Com a queda da arrecadação, tivemos menos dinheiro para educação, que começou a melhorar agora, e tivemos dinheiro para contratar as empresas que vão fazer as obras”, justifica.
Raimundo Pereira ainda enfatiza que é desejo de todos os dirigentes municipais o retorno das aulas semipresenciais. “Todos querem voltar e ter a criança na escola, porque é um lugar seguro, obedecendo todos os protocolos de segurança. Só que cada um tem seu planejamento, não dá para obrigar uma data para todo mundo, tentando impor a responsabilidade de assumir o funcionamento das escolas, sem se adequar à realidade de cada um”, completa o presidente da Undime.
Obras
Em Santo Amaro, no Recôncavo da Bahia, não há definição de quando as aulas voltarão, justamente pelo estado em que as escolas foram encontradas pela nova gestão, eleita em 2020. Segundo o secretário de Educação de lá, Ednilson Pereira, todas as 63 da rede municipal ainda precisam de intervenção – 60% estão com reforma completa e 40% precisam de pelo menos algum tipo de manutenção.
“Com a mudança de gestão, as escolas ficaram sem atenção, muitos muros caíram, a parte hidráulica não funciona, precisou de limpeza, capinação e recuperação de telhado. O ano de 2020, que deveria ter sido o ano para isso, não foi, porque foi ano de política e acabaram não se preparando para isso. Mas estamos em processo de licitação e obras para fazer as adaptações”, afirma Pereira.
As aulas do segundo semestre iniciaram em julho, de forma remota. A previsão de retorno das aulas semipresenciais em Santo Amaro é em setembro, se as obras acabarem a tempo. Contudo, o secretário defende que seja só em 2022. “Se voltar em setembro, teríamos dois meses e meio só de aulas, com 50% da capacidade, então poderíamos concluir o ano de forma remota, mas iremos discutir com a categoria, pais e alunos”, pontua.
A vantagem de só iniciar o ensino híbrido ano que vem seria também para economizar. “O investimento com equipamento do protocolo sanitário e de proteção é de R$ 500 mil, considerando que temos que distribuir máscaras para os 9,7 mil alunos. O gasto é muito grande, que poderíamos deixar para o ano que vem”, argumenta.
O outro lado da moeda é que nem todos os estudantes têm acesso às aulas remotas. “Das 63 escolas, 19 estão na sede e 42 na zona rural, e muitos alunos não têm acesso à internet, alguns pais estão temerosos de mandar os alunos, já que é só um professor vacinado e 30 crianças sem imunização na sala. A gente gostaria muito de voltar, mas precisamos discutir e ter um controle maior da pandemia”, acrescenta o secretário. Todos os 842 profissionais da educação de Santo Amaro tomaram, pelo menos, uma dose da vacina contra covid-19, e a segunda dose será em aplicada em agosto.
Sem previsão
A espera pela conclusão das obras também é o entrave para o retorno das aulas em Mucugê, na Chapada Diamantina. Por isso, a secretária municipal de Educação, Rose Lima, nem sabe dar uma estimativa. “Não temos data, porque todas as 22 escolas estão em reforma e não tem previsão de acabar. A nova gestão assumiu e resolveu reformar tudo, porque estavam em situação complicada e precisando se adaptar aos protocolos”, comenta Rose.
No Extremo-Sul da Bahia, na cidade de Pau-Brasil, as aulas só voltam após os professores tomarem a segunda dose da vacina, assim como em São Felix, no Recôncavo. “Alguns professores tomarão em setembro, então, provavelmente, em outubro, retornaremos com o ensino híbrido”, informa a secretária de Educação, Gizelle Nascimento. Segundo ela, todas as cinco escolas estão reformadas, aptas para receber os alunos. O transporte escolar não precisa de licitação, pois o município já tem frota própria. Ao todo, são 1.684 alunos e 97 professores.
Em Senhor do Bonfim, no Centro-Norte da Bahia, a 380 quilômetros de Salvador, as instituições educacionais também estão em decadência. Segundo a secretária de Educação, Lourinalva Coelho, a gestão antiga só reformou 15 das 59 escolas da cidade, deixando as outras sem condição de receber alunos. “Tivemos que fazer uma auditoria, porque elas precisam ainda de muitos reparos. Tirando as 15 que foram reformadas, as outras estão em situação muito ruim, só sofreram reforma em 2012, então ficaram oito anos sem atendimento”, conta a secretária.
Além da infraestrutura, há o receio dos pais e falta de diálogo entre governo estadual e municipal. “O governador não ouviu o prefeito e o secretário de Educação do estado não ouviu o gestor para alinhar esse retorno, 60% dos pais não aceitam enviar seus filhos agora porque não consideram seguro e 80% dos nossos profissionais de educação também não consideram o momento propício”, acrescenta Lourinalva.
São 880 profissionais da educação acima de 18 anos – todos tomaram a primeira dose – e 10.060 alunos. O ensino tem sido remoto até então, com atendimento por WhatsApp. A previsão para o retorno semipresencial é em 4 de outubro, contudo, não há verba para o transporte escolar. “Muitos alunos do ensino médio dependem do transporte do município. Ainda que eles repassem um valor por aluno pelo programa PETE [Programa Estadual de Transporte Escolar], o saldo que temos é de R$ 110, para atender os alunos do estado. O valor em conta de 2020, que era de R$ 217 mil, a gestão anterior pagou a cooperativa. Então não temos como voltar as aulas”, conta a secretária de educação.
Como afirmou a Secretaria de Educação do Estado (SEC) anteriormente ao CORREIO, o valor a ser repassado pelo governo estadual aos municípios pelo programa PETE é de R$ 90 milhões. A primeira parcela, de R$ 45 milhões, será paga até dia 30 de julho. Além disso, 144 ônibus escolares foram entregues às cidades da Bahia, o que gerou um custo de R$ 33 milhões para o estado. Para esta reportagem, a SEC não respondeu sobre a expectativa para o retorno.
Retorno agendado
Em algumas cidades baianas já há data marcada para o início das aulas semipresenciais. É o caso de Vitória da Conquista, onde elas voltam em 2 de agosto, e Barra do Rocha, a partir de 8 de setembro, de forma gradual. Em Conquista, apenas 14% da rede municipal (24 das 170 escolas) voltarão mês que vem. Incialmente serão os alunos do 5º e 9º ano do Ensino Fundamental I, pois muitas escolas ainda estão em reforma.
“Na rede privada, as escolas voltaram dia 12 de julho, e, no dia 2 de agosto, vamos fazer o acolhimento, com atividades de conscientização e treinamento da equipe. Estamos preparando o retorno gradativo, escalonado, porque devemos retornar com todos os cuidados. Não podemos retornar agora porque algumas escolas precisam de ajustes”, explica o secretário de Educação de Vitória da Conquista, Edgard Andrade. Os alunos que não voltarem à sala continuarão no ensino remoto. Todos os 1,4 mil professores tomaram a primeira dose da vacina.
Em Barra do Rocha, a data para o retorno é dia 8 de setembro, no Ensino Fundamental I e II. A Educação Infantil voltará em 20 de setembro. “Estamos finalizando as adaptações das escolas, implantando as pias, as peças decorativas de prevenção ao covid e finalizando a marcação das cadeiras e salas, com o distanciamento”, informa o secretário de Educação, Elenilton Mendes. O retorno semipresencial será facultativo. “Fizemos uma consulta pública e deixamos que o pai escolhesse pelo ensino remoto ou híbrido, para que ele não se sinta obrigado em mandar a criança na escola”, completa Mendes. A merenda e o transporte escolar estão garantidos. São 11 escolas na da rede municipal na cidade, com 1.980 alunos e 281 professores.
Em Piritiba, os preparativos estão na reta final e a expectativa é voltar dia 16 de agosto. Em Feira de Santana, o modelo híbrido deve começar dia 23 de agosto, enquanto as reformam são concluídas. Em Porto Seguro e Cruz das Almas, as escolas reabrem para os alunos dia 2 de agosto e 14 de agosto, respectivamente. A primeira semana, em Cruz das Almas, será para acolhimento. Em Teixeira de Freitas, o anúncio da data de retorno será feito pelo prefeito na próxima quarta-feira (28).
Procuradas, as prefeituras de Pedro Alexandre, Santo Antônio de Jesus, Itaberaba, Nova Soure e Simões Filho não responderam até o fechamento desta reportagem. O prefeito de Jequié e presidente da União dos Municípios da Bahia (UPB), Zé Cocá, também não respondeu, assim como a União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme-BA).
87 mil professores não tomaram nem a 1ª dose da vacina
Nem todos os profissionais da educação estão vacinados contra a covid-19. De acordo com o levantamento da Undime, apenas 208 prefeituras baianas concluíram a aplicação da primeira dose da vacina – menos da metade das cidades baianas. Somente 58 aplicaram a segunda dose, o equivalente a 14% dos municípios do estado. Outras 307 nem iniciaram a aplicação da segunda dose do imunizante. Até este domingo (25), segundo o vacinômetro da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab), esse número está em 87.348. Ou seja 26,2% deles ainda não estão nem parcialmente imunizados. O total de vacinados da categoria com a primeira dose ou a Janssen (dose única) é de 246.844. Com a segunda dose, apenas 13.590. Isso significa que só 4% dos trabalhadores da categoria estão com o esquema de imunização completo contra o coronavírus.
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