A equipe econômica pretende enviar ao Congresso um projeto para ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda (IR) da pessoa física de R$ 1,9 mil para R$ 2,5 mil. A medida faz parte do esforço para aprovar a reforma tributária fatiada no Congresso. O valor ficaria abaixo do defendido pelo presidente Jair Bolsonaro e prometido na campanha eleitoral, de R$ 3 mil. Segundo um auxiliar do ministro da Economia, Paulo Guedes, não há margem no orçamento para compensar a perda na arrecadação.
Por outro lado, esse ajuste já permitiria repor a inflação de 2016 para cá. Cálculo do Sindifisco, sindicato que representa auditores da Receita Federal, estima defasagem de 113,09% desde 1996. A entidade defende que a faixa de isenção suba para mais de R$ 4 mil. Os detalhes da proposta do governo estão sendo fechados pela Receita Federal e a intenção é enviar a proposta nas próximas semanas. Ela será acompanhada também de ajustes no IR das empresas, que é de 15% sobre o lucro, mais um adicional de 10%.
A decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), de extinguir a comissão mista da reforma tributária significa, na prática, uma volta dos debates à estaca zero. A principal proposta é a unificação dos impostos. Mas entrar em um acordo sobre como ela será feita é tão complexo quanto o próprio sistema tributário brasileiro. Estados e municípios temem perder uma fatia de suas arrecadações e são muitos os impostos.
Emaranhado de impostos
O Brasil tem, pelo menos, cinco tributos embutidos nos preços de bens e serviços: três cobrados pela União (IPI, PIS e Cofins), um dos estados (ICMS) e um dos municípios (ISS). Só o ICMS tem 27 formatos diferentes, um para cada estado e o DF. Ou seja, para vender em outros estados, o empresário tem que pagar e conhecer os diferentes tributos.
Custo alto
Além da quantidade de tributos, o custo é alto. Um exemplo é a tributação geral de medicamentos, uma das maiores do mundo, em torno de 33%. Em países desenvolvidos é de cerca de 6%. Outro item essencial com carga tributária elevada, por exemplo, é o absorvente íntimo: 27% só de imposto.
Classificação
A classificação é outro problema recorrente. É perfume ou água de colônia? A alíquota da fórmula concentrada é 42%. Já a da fragrância mais leve, de 12%. “Uma grande diferença”, segundo o especialista em direito tributário e da FGV, Gabriel Quintanilha.
Burocracia sem fim
O Brasil é o país em que as empresas gastam o maior número de horas com a burocracia dos impostos, segundo um relatório do Banco Mundial que avalia 190 países. Uma empresa brasileira gasta, em média. 1.501 horas por ano cuidando de obrigações relacionadas a tributos. É cinco vezes a média gasta pelos países de América Latina e Caribe.
Efeito cascata
Esse nó de tantas informações e cobranças dificulta a vida e o caixa das empresas, além de facilitar erros. Segundo a Endeavor, 86% das empresas brasileiras apresentam algum tipo de irregularidade no pagamento de seus tributos. Estas lacunas muitas vezes são por desconhecimento das muitas regras. Mesmo assim, podem gerar multas e despesas altas.
A ideia é reduzir a alíquota principal em cinco pontos percentuais em dois anos, mantendo-se o adicional. Em contrapartida, o governo quer taxar dividendos entre 15% e 20%. O percentual ainda está sendo definido. Também faz parte da proposta a unificação do IR sobre aplicações em 10% em renda fixa e planos de previdência. Atualmente, as alíquotas começam mais altas e depois vão caindo até serem zeradas se o investidor deixar o dinheiro por mais tempo.
A medida seria uma forma de compensar perda na arrecadação. O governo pretendia zerar o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), mantendo o tributo apenas sobre bebidas, cigarros e automóveis. Mas deve adiar os planos porque isso exigiria a criação de um novo imposto sobre transações, nos moldes da CPMF.
Unificação do PIS e da Cofins
O pacote do governo contempla ainda a unificação do PIS e da Cofins — criando a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), projeto já enviado ao Congresso. Assim que as discussões começarem, a equipe econômica pretende propor ajustes no texto para vencer resistências do setor de serviços. Em vez de alíquota única de 12%, a ideia é fixar dois percentuais, conforme antecipou O GLOBO.
A Receita também está fazendo esses cálculos de modo a apontar alíquotas neutras, que não resultem em aumento de carga tributária e nem perda na arrecadação. O governo foi alertado que a proposta original poderá prejudicar empresas do setor de serviços que não estão enquadradas no Simples.
Na avaliação da equipe econômica, seria inviável aprovar ainda este ano uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que inclua impostos estaduais e municipais (ICMS e ISS), diante dos interesses envolvidos e dificuldade para construir consenso. O cronograma eleitoral de 2022 é um dos principais obstáculos.
Nova estratégia para ‘nova CPMF’
Contudo, Guedes não desistiu de recriar um imposto sobre transações financeiras nos moldes da CPMF, mas está sendo aconselhado a mudar a estratégia, diante de resistências. O plano é deixar que parlamentares da base aliada apresentem a proposta como iniciativa do Legislativo, com o argumento de que o novo imposto pode ajudar a financiar um programa robusto de transferência de renda, em substituição ao auxílio emergencial e Bolsa Família. Caso o novo imposto vingue, Guedes pretende desonerar a folha de salários das empresas e lançar a carteira verde amarela, sem contribuição previdenciária e demais penduricalhos, como FGTS, dentre outros.
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