Qual a explicação para o fato do Banco Central aumentar em 0,75% a taxa de juros – um aumento de 37% – quando a pandemia está se agravando, a economia está quase paralisada e as previsões de crescimento do PIB descendo ladeira abaixo? A resposta é simples: foi a boca do jacaré. Quando num gráfico de duas curvas a primeira registra a inflação subindo e a outra o crescimento do PIB caindo, tem-se uma assustadora boca de jacaré, que em economia chamamos de sintomas de estagflação, que representa o pior dos mundos: uma mistura de inflação e recessão. O Brasil está à mercê desse jacaré.
A inflação de 12 meses vai se aproximar de 7% em abril e a atividade econômica dá sinais de forte queda, com o agravamento da pandemia e o fechamento de muitas atividades nos estados. No mercado financeiro, estima-se que o PIB brasileiro vai cair 0,6% no primeiro trimestre e 0,9% no segundo. Existe, é verdade, possibilidade de reversão desse quadro, pois a liberação do auxílio emergencial, ainda que em valores menores do que na primeira versão, pode fazer a economia se aquecer e assim diminuir o tamanho da boca do jacaré. Mas com a inflação será mais difícil e este economista vem avisando há meses que ela iria disparar.
O aumento de 0,75% na taxa de juros mostra que o Banco Central está atento, mas seu efeito é pífio no controle da inflação, não só porque o percentual é pequeno e terá impacto reduzido na redução demanda, mas principalmente porque não é a demanda que está fazendo a inflação crescer. São vários os fatores que empurram a inflação para cima e o principal deles é a cotação do dólar. O preço do dólar está alto por vários motivos. O primeiro é o crescimento da dívida pública. Que já chegou a 100% do PIB. Você leitor emprestaria dinheiro a alguém que tem uma dívida de 100% de sua receita? Emprestaria, mas exigiria juros muito mais altos.
Por isso, quando o governo vai ao mercado financiar a dívida, os investidores não aceitam a taxa Selic e querem juros de 8% para emprestar dinheiro ao governo. Além disso, a incerteza faz a cotação do dólar aumentar. Incerteza em relação à administração da pandemia, incerteza no que diz respeito a uma eleição extremamente polarizada que se avizinha, incerteza em relação à capacidade do Ministério da Economia de controlar os gastos do governo e a dívida pública, já atingiu 100% do PIB.
Toda essa incerteza faz o dólar aumentar de preço, não só porque os investidores externos fogem do país, reduzindo a oferta, mas também porque a procura por dólar aumenta, já que esse ativo é o que mais traz segurança quando não se sabe o que vai ocorrer amanhã. Para que essa situação seja contornada, o governo terá de continuar aumentando os juros e mostrar claramente ao mercado sua intenção de cortar os gastos. E, claro, se houver a vacinação em massa, a economia voltará a funcionar normalmente, o PIB voltará a crescer e a boca do jacaré vai diminuir.