A cúpula do Ministério da Saúde espera que o Brasil atravesse nas próximas duas semanas o pior momento da pandemia. O Valor apurou que, no entorno do ministro Eduardo Pazuello, a expectativa é que haja uma explosão de casos e mortes no período, com os óbitos ultrapassando a barreira dos 3.000 por dia. O diagnóstico decorre de uma tempestade perfeita: o alastramento do vírus em todo o país, impulsionado pelas aglomerações no fim do ano e no carnaval; a população da população de manter-se em isolamento social; a circulação no país de novas variantes mais contagiosas e com grande carga viral; a iminência de um colapso do sistema hospitalar em diversos Estados ao mesmo tempo; ea falta de vacinas disponíveis para imunizar os brasileiros.
As atenções da pasta estão voltadas sobretudo para a região Sul. No Rio Grande do Sul, por exemplo, uma ocupação de leitos de UTI tem estado próximo ou acima de 100% durante toda a semana. Na região Norte, embora o número de casos seja menor, há preocupações quanto à disponibilidade de leitos. Os alertas também já dispararam quanto à situação de Estados como Goiás, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Na visão da equipe de Pazuello, São Paulo tem conseguido até o momento evitar o pior por possuir a maior rede hospitalar do Brasil. Principal porta de entrada do país, o Estado mais populoso da federação registrou 60 mil das cerca de 260 mil mortes pelo coronavírus em solo brasileiro. Para a equipe de Pazuello, se um colapso hospitalar ocorrer ali, os números dessa “tragédia anunciada” podem subir exponencialmente.
A cúpula da Saúde entende que não há muito no momento o que fazer, a não ser estimular a reabertura de hospitais de campanhas nos Estados. O governo federal também cogita novas instalações desse tipo já nos próximos dias. As ações de restrições e restrições à circulação de pessoas estão nas mãos dos Estados. O governo federal não vai decretar lockdown nacional, escorado em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) e também por acreditar que as decisões devem ser tomadas levando em consideração os critérios regionais. Para o médio prazo, conforme projeções da equipe de Pazuello são mais otimistas. A estimativa é que a vacinação se acelerar a partir deste mês, com a maior produção do Butantan e da Fiocruz. Em abril, ambos já devem estar produzindo 1,4 milhão de doses diárias.
Com as diversas vacinas importadas começando a chegar, uma expectativa de Pazuello é vacinar 70 milhões de pessoas até o fim de junho. Fazem parte desse grupo prioritário idosos com mais de 60 anos, pessoas com comorbidades e médicos, professores, policiais, indígenas, entre outros. Na quarta-feira, o Ministério da Saúde anunciou a intenção de comprar 100 milhões de doses da vacina da Pfizer e outras 38 milhões de doses da vacina da Janssen, braço farmacêutico da Johnson & Johnson. Segundo um cronograma ao qual o Valor teve acesso, o ministério de espera para o primeiro semestre a chegada de apenas 9 milhões de doses desse total, todas da Pfizer. Outras 30 milhões de doses do fabricante americana devem chegar entre julho e setembro. As entregas se aceleram no último trimestre, com 61 milhões de doses.
Já a Janssen deve entregar 16,9 milhões de doses em setembro e 21,1 milhões de doses em dezembro, segundo ficou apalavrado entre o ministério e a farmacêutica. O Ministério da Saúde pretende autorizar a compra de vacinas por empresas e entes privados somente quando os grupos prioritários levados imunizados. Isso será feito por decreto, e como empresas precisam fazer isso para doar metade dos lotes para o Plano Nacional de Imunização (PNI). O governo, porém, jogará toda sua força política para evitar que Estados façam o mesmo. O ministério já sinalizou aos laboratórios, com quem mantém contratos bilionários, que negociar com governadores individualmente ou em grupo não agradaria o governo federal. A impressão de governadores que estiveram reunidos com Pazuello nesta semana foi a mesma: dificilmente conseguirão adquirir vacinas adequadas ou em consórcios.
Planalto e Saúde tentam evitar que o governo federal perca o protagonismo na imunização – como aconteceu em janeiro, quando o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), vacinou a primeira pessoa em território nacional com transmissão ao vivo pela TV. Ontem, um grupo de 14 governadores adicionou a carta a Jair Bolsonaro pedindo a providências “imediatas” para a compra de novas doses de vacinas contra a covid-19. Eles citaram um “aumento exponencial dos casos de infecção e do número de óbitos” nos últimos dias. E dizem que estão “no limite de suas possibilidades e possibilidades”.
Pazuello espera que toda uma população disponível até o fim do ano. E pretende deixar a carga somente quando isso acontecer. Segundo interlocutores, os partidos do Centrão já entendem que dificilmente Bolsonaro trocará ou auxiliares, de sua extrema confiança, durante uma pandemia. O número diário de 3.000 mortes, caso seja alcançado, não será um recorde mundial. Os Estados Unidos já chegaram a registrar mais de 5.000 mortes por dia no início de fevereiro, segundo a Universidade Johns Hopkins. Bolsonaro desistiu nesta semana de fazer um pronunciamento em cadeia de rádio e TV sobre vacinação. A fala seria veiculada boletins informativos na terça-feira, dia em que as mortes pelo coronavírus atingiram um recorde de 1.726, segundo o consórcio de veículos de imprensa. Foi, então, adiada para a quarta. Mas, diante de um novo recorde de 1.840 mortes, ele desistiu de vez da ideia.
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