segunda, 25 de novembro de 2024
Euro 6.1387 Dólar 5.8319

MOVIMENTO DE TURISTAS CAUSA ATÉ ENGARRAFAMENTO DE AVIÕES EM PORTO SEGURO

Redação - 28/12/2020 07:06

O município de Porto Seguro no sul da Bahia chegou a apresentar congestionamento de voos por causa da grande aglomeração que está no local para as festas de final de ano. Enquanto pedalava pela BR-367, uma das vias que levam a Trancoso, o guia de turismo Daniel Isidório viu uma cena que chamou a atenção: cerca de 40 vans e carros seguirem para o distrito de Porto Seguro. Os turistas não param de chegar àquela região do sul baiano – que engloba ainda Caraíva, outro distrito de Porto Seguro, e a cidade de Una. E o engarrafamento não era só por terra. No céu, jatinhos têm dado voltas até conseguir pousar.

Os turistas começaram a chegar à região de Trancoso e Caraíva dia 26, sobretudo em aviões particulares ou fretados. Anteontem à noite, por volta das 19h, uma aeronave precisou pousar em Porto Seguro e esperar ser liberada para descer em Trancoso, no Aeroporto Terravista – privado, em um condomínio. Entre dezembro e janeiro, são esperados, só em Porto Seguro, 600 voos regulares, segundo a Secretaria Municipal de Turismo.

“Muito voo comercial chegando, muito jato particular. Aqui tem rodado o comentário que muitos voos estão tendo até que esperar para pousar”, conta Daniel. Em Trancoso, no Aeroporto Terravista, um funcionário disse que passou a haver concentração de voos, como já era esperado para o período. Somente anteontem foram 48 voos. Em uma alta temporada como o Carnaval, Salvador recebe, em média, 170 voos diários, conforme estimativa Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (Secult) para a folia de 2020.

O perfil de quem chega àquele perímetro é basicamente sudestino – sobretudo paulista – e representa o pico da pirâmide econômica brasileira. Anteontem, o Tribunal de Justiça da Bahia concedeu uma liminar que atendeu um pedido do governo da Bahia proibindo a autorização “de shows e festas, públicas ou privadas” em Porto Seguro. O prefeito eleito, Jânio Natal (PL), havia dito que liberaria eventos após a posse. Mas a decisão, como a pandemia, não afastou os turistas mais abastados, que alugam mansões para festas privadas – a Polícia Militar acabou com uma festa com 200 pessoas em Trancoso. Já desembarcaram no vilarejo as influenciadoras Thássia Naves, Camila Coelho e a empresária Cris Arcangeli.

Mas, em Caraíva, distrito de Porto Seguro um pouco mais longe que Trancoso, a festa também acontece no meio da rua, uma vez que a maioria dos bares e restaurantes estão com horários limitados, capacidade reduzida e sem permissão para música ao vivo. “Caraíva virou a balada a céu aberto. Está muito absurdo, as pessoas bebem e se drogam no meio da rua, é muito barulho, muita aglomeração e muito desrespeito. É uma vila sem regra, não tem ninguém fiscalizando. Atravessou o rio, cada um faz o que bem entende”, narra a arquiteta e ativista Rafaela Zincone, que mora em Caraíva há 14 anos e integra o Conselho Comunitário Ambiental de Caraíva.

Segundo ela, os turistas que vão até a vila buscam justamente isso: liberdade e zero restrições. “O turismo aqui não é consciente, as pessoas vêm para explorar. A maioria é de São Paulo, Rio de Janeiro, de cidades que estão cheias de restrições. Então, eles saem do Sudeste procurando destinos mais frágeis, para extravasar, onde não tem regras, para fugir e fazer as coisas que não podem”, critica a moradora.

A atração de turistas faz a população da vila, que tem cerca de 700 nativos, ficar sete vezes maior todo verão. As consequências, este ano, para Rafaela, serão agravadas com a pandemia. “A população flutuante do fim de ano é sete vezes o tamanho da população da vila. Então, a gente vai sofrer duas crises, a superpopulação, que gera o triplo de lixo, poluição no rio, contaminação do lençol freático, e, ao mesmo tempo, temos a pandemia, o que gera um caos absoluto, porque nossa população está num lugar em que o ecossistema é frágil, a saúde é frágil e é fronteira com o território indígena”, argumenta a ativista.

Uma nativa, que pediu anonimato, afirma que está impossível viver na vila durante esse período, principalmente pela falta de consciência dos turistas em seguir os protocolos sanitários. “A vila está superlotada. A maioria das pessoas que chegam aqui não se conscientizam com o nosso viver. Eles não usam máscara, não respeitam, fazem várias aglomerações. É muito lixo, muita droga, muita bebida. Para conviver em Caraíva hoje, infelizmente, está muito difícil. A infância que tive aqui meus filhos não vão ter e não estão tendo mais”, conta. Ela é mãe de três filhos, e, um dia, um deles encontrou cocaína em um tênis enquanto brincava na rua.

Foto: divulgação

Copyright © 2023 Bahia Economica - Todos os direitos reservados.