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ALCKMIN QUESTIONA PROVAS DA ODEBRECHT E PODE TRAVAR AÇÃO

Redação - 15/12/2020 07:10 - Atualizado 15/12/2020

A defesa do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) repete estratégia usada na Lava Jato pelos advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no processo em que o tucano é réu sob acusação de corrupção, lavagem de dinheiro e caixa dois eleitoral. Na ação, que integra o braço eleitoral da operação, os advogados do ex-governador de São Paulo pedem acesso integral aos sistemas usados pelo chamado setor de propinas da Odebrecht.

Com a solicitação, a defesa do tucano levanta suspeitas sobre as provas apresentadas pela empreiteira e pede análise de dados preservados em Curitiba que já passaram por perícia forense. Solicitações similares travam a principal ação pendente de sentença contra Lula em Curitiba, inclusive com respaldo do Supremo Tribunal Federal.

O processo contra Alckmin se refere a pagamentos para as campanhas eleitorais de 2010 e 2014, quando ele venceu as disputas pelo governo do estado. Segundo a Promotoria, o ex-governador recebeu R$ 2 milhões em espécie da Odebrecht na campanha de dez anos atrás e R$ 9,3 milhões quando disputou a reeleição. O Ministério Público Eleitoral em São Paulo diz que o ex-governador cometeu crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e de caixa dois.

As principais provas são registros nos sistemas Drousys, de comunicação interna da empreiteira, e MyWebDay, de contabilidade e controle de pagamentos de vantagens indevidas. Esses dados, segundo a acusação, corroboram os relatos contra Alckmin feitos por delatores. Os arquivos relativos aos sistemas estão sob a guarda do Ministério Público Federal em Curitiba, responsável por firmar o acordo de delação com a Odebrecht.

A parte do material relativa ao tucano foi remetida a São Paulo e subsidiou o inquérito da Polícia Federal contra ele. A defesa de Alckmin ressalta que ele não recebeu nem permitiu que se recebesse qualquer dessas doações, sobretudo não declaradas. Mesmo com o Ministério Público apontando que as provas passaram por perícia forense, a equipe de advogados do ex-governador tem questionado a sua integridade. A defesa diz que, apesar de o sistema ter mais de 100 milhões de itens e 80 terabytes de informações, ela não teve acesso “à íntegra do material, ou mesmo à parte que se refere aos fatos denunciados”.

“Como saber se não há mais nada nessa imensidão de documentos que diga respeito aos fatos? Lembrando que a defesa tem direito de acessar o todo para então escolher os elementos que lhe são úteis para a formulação de suas teses, independentemente de serem ou não utilizados pelos investigadores ou mencionados na denúncia”, questiona a peça, assinada por seis advogados, entre eles José Eduardo Alckmin, Verônica Sterman e Márcio Elias Rosa, ex-chefe do Ministério Público de São Paulo.

Os advogados dizem ainda que “os sistemas de informática eram facilmente manipuláveis e carecem de cadeia de custódia [o registro da geração e da manipulação dos sistemas] que ateste validade jurídica do material”. A defesa de Lula também questiona exatamente esse mesmo ponto, ao pôr em dúvida a autenticidade dos dados da Odebrecht utilizados pela acusação no Paraná.

Tanto Alckmin quanto o Ministério Público Eleitoral mencionam em seus argumentos a situação do processo do ex-presidente que tramita no Paraná. Os advogados de Alckmin querem o acesso integral ao material ou “ao menos à parte relacionada aos fatos” para “realização de cópia forense e verificação da cadeia de custódia”. Caso isso não aconteça, dizem, pedem que o material não possa ser utilizado na ação e que ele seja considerado nulo.

O mesmo pedido foi feito pela defesa do ex-secretário Marcos Monteiro, homem de confiança de Alckmin e apontado pela acusação como o responsável por ter negociado os R$ 10 milhões de repasses da Odebrecht por meio de caixa dois em 2014. Sua defesa tem afirmado que ele não cometeu irregularidades.

Até agora, o pedido não foi aceito pelo juiz eleitoral Marco Antonio Martin Vargas, responsável pelo processo. Ele acolheu a solicitação do Ministério Público e pediu para que as defesas indiquem “a prova que pretendem produzir nos sistemas” e “sua imprescindibilidade para o exercício do direito de defesa pelos acusados”. “Os documentos relacionados ao objeto da ação penal, extraídos de ambos os sistemas, já se encontram juntados aos autos, e devidamente periciados, como já detalhado”, disseram os promotores.

“O caráter genérico do requerimento formulado [pela defesa] coloca em dúvida a sua própria admissibilidade, dado o fundado receio de que possa implicar a indesejável e irrazoável demora injustificada do processo.”. Questionados sobre a situação, os promotores responsáveis pelo caso afirmam que a defesa tem o direito de querer produzir uma contraprova sobre o caso, mas que ela deve ter o ônus de apresentá-las. Em Curitiba, a discussão relativa a provas da Odebrecht se alonga há anos na ação penal que trata da compra de um terreno pela empreiteira para o Instituto Lula, em São Paulo.

A defesa do ex-presidente, comandada pelo advogado Cristiano Zanin Martins, recorreu ao STF (Supremo Tribunal Federal) para ter acesso amplo aos sistemas MyWebDay e Drousys, utilizados pela acusação para reforçar as suspeitas de pagamentos de propina. O juiz responsável pelo processo, Luiz Bonat, que sucedeu Sergio Moro na Vara Federal, entende que os advogados já tiveram o devido acesso a esses dados.

Escreveu em despacho que um parecer do assistente técnico da defesa acerca do sistema feito em 2018 já foi até incluído nos autos. Diz ainda que, em 2019, autorizou novos acessos aos sistemas. Já disse anteriormente, sobre a cadeia de custódia dos dados, que há indícios de “inidoneidade desse material” e que somente com o acesso ao acordo de leniência da empreiteira a defesa poderia apurar em quais condições o acervo eletrônico foi obtido pela Odebrecht. ​

Em setembro, o ministro determinou acesso incondicional à defesa de Lula a todos os dados que lhe diziam respeito no acordo de leniência, o que inclui as informações eletrônicas dos sistemas de pagamentos. Na ocasião, a defesa dizia que o juiz de primeira instância havia dado ao Ministério Público e à Odebrecht a possibilidade de fazer uma seleção prévia do que poderia ser acessado.

Os advogados continuaram reclamando das limitações e, no último dia 24, o ministro do Supremo reiterou sua decisão, que trata ainda do acesso às correspondências entre os procuradores da Lava Jato e autoridades dos Estados Unidos e da Suíça, que também firmaram acordo com a Odebrecht. Lewandowski disse que o prazo para alegações finais (manifestação das partes antes da sentença) só poderá ser fixado com o “cumprimento cabal” de sua decisão. A ação tramita no Paraná desde 2016.

Os procuradores do Paraná falam nos autos que os pedidos têm o propósito de retardar a tramitação do processo. Procurados, os advogados de Alckmin afirmam que, como a prova apresentada pela empresa em sua leniência com o Ministério Público Federal no Paraná foi “emprestada” para fundamentar a ação de São Paulo, a defesa tem o direito de examiná-la e auditá-la.

“O MP Eleitoral, usando a prova emprestada, escolheu qual prova usar para imputar àquelas pessoas a prática de crimes eleitorais. É nessa prova que eles usaram que nós temos que fazer a perícia. Senão a gente vai cair no equívoco que pode ter prova unilateral”, diz o advogado Márcio Elias Rosa.

A defesa ainda questiona o valor do material apresentado pela Odebrecht como prova. “Nós estamos em face de registro do sistema informatizado de uma empresa que, fazendo a leniência ou a colaboração —confessando, portanto, crimes—, entrega [os dados dos sistemas] para o Ministério Público e para a Polícia Federal”, diz Rosa. “Nós não estamos em face de documentos públicos nem de um sistema público informatizado. É planilha Excel. Qual é a confiabilidade disso?”, questiona​.​

Questionada a respeito das afirmações feitas pelos advogados, a Odebrecht disse que colabora com as autoridades desde 2016 e não se manifestou especificamente sobre os argumentos apresentados pelas defesas. “Hoje, a Odebrecht, inteiramente transformada, tem um sistema de conformidade que previne e detecta potenciais violações das leis anticorrupção.”

Foto: divulgação

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