Mais de 400 resgates de animais silvestres foram contabilizados pelos agentes do Grupo Especial de Proteção Ambiental (GEPA) da Guarda Civil Municipal (GCM) durante a pandemia. De março a julho, foram 442 resgates, o que representa um aumento de mais de 100% em relação ao mesmo período de 2019, quando foram resgatados 210. Um dos quatro fatores apontados para esse crescimento pelo supervisor interino do GEPA, André Ferreira, é o isolamento social e o fato de algumas áreas terem deixado de ser frequentadas, a exemplo de trilhas e praias.
“Nós tivemos o surgimento de mais serpentes, por exemplo. O aumento foi de pouco mais de 90%. Nesse caso, o isolamento social colaborou com essa aproximação da zona urbana, pois a cobra é um animal ectotérmico, precisa de luz do sol para se aquecer. Então, elas procuram essas trilhas que deixaram de ser ocupadas pelas pessoas devido ao isolamento social”, afirma.
Os outros três fatores apontados por ele são o crescimento imobiliário, a construção de novas pistas na cidade, o fato de ter chovido muito de março a julho e mais conhecimento da população em relação às ações do GEPA. “Antes, as pessoas não sabiam a quem recorrer e agora elas estão tendo acesso ao nosso número de telefone e estão ligando mais. Nós recebemos uma média seis ligações por dia”, diz.
Para o biólogo Mikhail Barreto, mestre em Meio Ambiente, Águas e Saneamento, é possível inferir que o aparecimento de animais silvestres em determinados locais onde antes não eram tão comuns tem uma relação com a redução da quantidade de pessoas circulando nas ruas no período da pandemia.
“A presença de pessoas afasta esses animais do ambiente urbano ocupado, que se refugiam em áreas mais protegidas e com a natureza preservada. A partir do momento em que o ser humano não está tão presente nesses ambientes urbanos, principalmente aqueles próximos a parques e a locais onde ainda há resquícios de vegetação preservada, os animais se sentem mais à vontade para frequentá-los novamente, até mesmo em busca de alimento e de abrigo”, diz Mikhail.
A praia do porto da Barra, que em dias comuns fica cheia de banhistas, até mesmo à noite, foi o local escolhido por uma tartaruga da espécie Oliva para desova. O fato inusitado ocorreu no mês de junho. Na manhã seguinte, os cem ovos foram recolhidos pelo Gepa e entregues à bióloga do Projeto Tamar Natália Berchieri.
Ela conta que os ovos permanecem em um cercado para a incubação na base do projeto, em Arembepe, e os filhotes devem nascer na próxima semana. “Nós fizemos um ninho bem parecido com o da mãe e estamos acompanhando o processo de incubação, que nesse período de inverno é de mais ou menos 60 dias. Pode ser que nasça ou não. Pode ser que os ovos não tenham sido fertilizados, porque nem toda a ninhada vinga”, explica.
A maior concentração de desova da espécie Oliva na Bahia ocorre na região de sítio do Conde e Coqueiros até Sergipe. No entanto, o animal aproveitou a calmaria da praia desocupada da Barra para desovar. “A desova não é comum na Barra. É comum na área que vai do Farol de Itapuã até a Praia do Flamengo. Essa é uma área regular de desova, onde temos um monitoramento anual. Na Barra, nós tivemos que tirar os ovos porque os filhotinhos, quando nascem, se orientam com a luminosidade do horizonte no oceano. Se tiver alguma luz acesa, eles acabam se desorientando, pegam o caminho contrário e morrem desidratados ou acabam sendo atropelados”, conta Natália.
De acordo como Gepa, de janeiro a julho de 2020, foram realizados 207 atendimentos relacionados à tartaruga na capital, entre resgate, recolhimento de ovos e aparecimento de tartarugas mortas.Em Salvador, os animais mais resgatados em vias urbanas e áreas residenciais são as serpentes (30% do total), saguis, iguanas e gambás. Mas também são resgatados corujas, gaviões, tamanduás, ouriços, bichos-preguiça, tartarugas e jacarés.
As serpentes são encontradas em toda a cidade, mas as peçonhentas aparecem mais comumente na região da Praia do Flamengo e Stella Maris. É comum o resgate de jararaca nesses bairros e o de cobra-coral na região de Narandiba. O sagui, gambá e a iguana também são encontrados em toda a cidade. O jacaré é encontrado na região da Paralela e Pituaçu (por conta dos resquícios de lagoa e do crescimento imobiliário) e também na Suburbana. Já as raposas são mais frequentes no bairro de Mussurunga.
Contato – Ao avistar algum animal silvestre em área urbana, a recomendação é que o cidadão entre em contato com o GEPA por meio do telefone (71) 3202-5312. A população não deve tentar pegar o animal ou estabelecer algum tipo de contato. Por se tratar de animais selvagens que não têm contato direto com o homem, eles podem provocar um acidente.
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