A meta para as matrículas no ensino superior, prevista no Plano Nacional de Educação (PNE), deverá ser atingida só em 2041 – 17 anos após o previsto, de acordo com uma projeção feita pela Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (Abmes), obtida pelo G1. A análise foi feita com base no ritmo de crescimento das matrículas até 2018, considerando o Censo da Educação Superior, e o crescimento da população nesta faixa etária, conforme o IBGE.
Considerando o impacto da pandemia na educação, o cenário poderá ser ainda pior. Com o aumento do desemprego, a redução da renda, mudanças propostas na reforma tributária e em programas de acesso ao ensino superior, Sólon Caldas, diretor-executivo da Abmes, afirma que a consequência será um “apagão” na mão de obra qualificada dentro de cinco anos, período médio de duração da graduação.
Ao todo, as instituições privadas correspondem a 73,7% das matrículas no ensino superior, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) de 2019, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo o PNE, 33% dos brasileiros entre 18 e 24 anos deverão estar no ensino superior até 2024, mas no ritmo que as matrículas estão, o percentual deverá ser alcançado quase duas décadas após o previsto.
“Levando em consideração o financiamento estudantil, as vagas do Prouni, o aumento da carga tributaria e, consequentemente, o aumento do valor da mensalidade, vai ser um prejuízo grande para o país. Vai ser um apagão de mão de obra nesses [próximos] cinco anos. Vamos deixar de ter milhares de alunos formados, que poderiam contribuir com desenvolvimento no pós-pandemia”, avalia Sólon Caldas.
Evasão e inadimplência
A crise econômica da pandemia trouxe o aumento do desemprego e a redução de renda. O cenário impacta no pagamento das mensalidades, seja porque o próprio estudante teve o salário reduzido, ou porque a família passou por essa situação. Uma pesquisa feita pela Abmes e divulgada em junho indica que 23,9% dos matriculados não conseguiram pagar a mensalidade do curso em maio, aumento de 51,7% na taxa de inadimplência, se comparada ao mesmo mês de 2019.
Mais de 40% dos entrevistados disseram ter risco de desistir do curso, e a perda de renda foi apontada como principal fator: 22% declararam ter perdido o emprego; 19% disseram ter tido redução de até 70% na jornada ou contrato suspenso. Entre os que declararam continuar estudando, 30% afirmava que conseguia pagar até 3 meses; 20% por até 6 meses; 7% por até 12 meses. Outros 41% disseram não conseguir estimar, mas assumiam que teriam problemas futuros. Entre potenciais alunos, 43% deles afirmaram que planejavam começar a graduação só quando a situação se normalizar.
Financiamento Estudantil
Em dezembro de 2019, o Ministério da Educação (MEC) anunciou mudanças no programa de Financiamento Estudantil (Fies): a resolução prevê um corte de quase metade das vagas oferecidas. De acordo com o texto, a quantidade poderá passar de 100 mil em 2020 para 54 mil em 2021 e 2022 – redução de 46%. Segundo o MEC, o número poderá ser revisto, anualmente, caso haja alteração nos parâmetros econômicos atuais ou nos aportes do Ministério – o que não é muito esperado frente ao cenário econômico agravado pela pandemia. A queda se somará a outras acumuladas ao longo dos anos, afirma Sólon. Dos 731 mil contratos concedidos em 2014, restaram 85 mil no ano passado.
O Fies oferece financiamento para pagar mensalidades do ensino superior em universidades privadas. Uma das categorias oferece juros zero para os estudantes com renda mensal familiar de até três salários mínimos; e outra, para quem tem renda mensal familiar de até cinco salários mínimos, oferece empréstimo a juros relativamente baixos, variando de acordo com o banco que atua como agente financeiro.
Reforma tributária
Sólon afirma que as mudanças propostas na reforma tributária do governo vão aumentar os impostos pagos pelas instituições de ensino e, consequentemente, o valor será repassado para as mensalidades. “Quando governo aumenta carga tributaria das instituições de ensino, essa diferença certamente será repassada para mensalidades. Mas esse grupo de alunos que já está no limite do que pode pagar. Com isso eles vão abandonar, vão deixar de estudar porque não vão conseguir pagar mensalidade”.
Prouni
Sólon alerta que a medida provisoria 934, que está tramitando no Senado, vincula a abertura de processos seletivos, como o Programa Universidade para Todos (Prouni), à divulgação do resultado do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O mesmo deverá ser aplicado em relação ao Sistema de Seleção Unificada (Sisu), caso a MP não sofra alterações. No entanto, como o Enem foi adiado por causa da pandemia e terá as provas realizadas em janeiro e fevereiro de 2021, a correção e divulgação do resultado deverá ocorrer depois do primeiro trimestre, o que na prática impede o Prouni do primeiro semestre de 2021.
O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), disse que existe a possibilidade de esse artigo ser vetado pelo presidente Jair Bolsonaro, conforme solicitação do senador Izalci Lucas (PSDB-DF). “A partir [desse trecho], o único critério de inclusão no Prouni é através do Enem. Como o Enem foi adiado, muitas faculdades vão ficar sem os alunos, porque o único critério é o Enem”, argumentou Izalci.
Metas do PNE
O Plano Nacional de Educação tem 20 metas a serem atingidas, desde o ensino infantil até a pós-graduação, incluindo também a educação de jovens e adultos. A análise da Abmes foi feita em cima da meta 12, sobre o ensino superior. O texto do PNE determina que, até 2024, 33% dos brasileiros entre 18 e 24 anos estejam matriculados no ensino superior. Em 2018, o número era de 17%.Relatório do Inep aponta retrocessos e descumprimento de metas do Plano Nacional de Educação. Jovem fora da escola custa mais ao país do que para mantê-lo estudando, diz pesquisa.
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