No dia da Indústria é imperativo avaliar o presente e pensar o futuro. O presente, neste fatídico ano de 2020, tem a cara do Covid-19, o vírus que impactou negativamente a economia da Bahia e do mundo. O isolamento social, única terapia conhecida e comprovada para minimizar os efeitos do vírus, afetou diretamente todos os setores, mas isso se deu de forma diferenciada, pois, enquanto alguns segmentos reduziram a zero sua produção, outros até lucraram mais com a pandemia. A produção e o varejo ligados a alimentos, remédios, produtos médicos e de limpeza, delivery em geral e outros ampliaram suas vendas por causa da pandemia. E no setor industrial não foi diferente.
Dois ramos importantes da indústria de transformação baiana, aumentaram a produção e ampliaram as vendas, focados no mercado externo. A produção de derivados de petróleo e bio combustíveis aumentou cerca de 40% no quadrimestre e fez a Petrobras retomar o posto de líder na pauta de exportações da Bahia, perdido há mais de 4 anos. A produção de papel e celulose também cresceu na pandemia por conta do aumento do consumo de papéis para fins sanitários e de higiene. Como a Petrobras representa cerca de 30% da produção industrial baiana, se for mantido o crescimento nesses 2 ramos a queda no PIB industrial será menor que o previsto. Além disso, o melhor desempenho da produção petrolífera, que responde por cerca de 20% da arrecadação de ICMS, tende a minorar a forte pressão a que estão submetidas as finanças estaduais.
Apesar dos casos pontuais e dos ramos de produtos alimentares e bebidas, que estão se mantendo, todos os demais segmentos da indústria de transformação registraram quedas expressivas na produção, como é o caso da petroquímica. E alguns segmentos estão simplesmente paralisados por conta da queda da demanda, a exemplo da indústria automobilística e de alguns setores da metalurgia e da produção de pneus. Os dados são da SEI – Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais.
No geral, a pandemia impactou fortemente a indústria baiana, mas não mudou os problemas e os desafios do setor. A privatização da RLAM – Refinaria Landulpho Alves, ora em andamento, é urgente e sua efetivação acena com novos investimentos na área do refino. A estatal também está saindo do ramo de prospecção, mas há interesse do setor privado na compra dos quase 3 mil poços baianos, dependendo apenas de condições favoráveis e da recuperação dos preços do petróleo.
A privatização da RLAM inclui também a venda do 2º maior terminal portuário do país, o Terminal de Madre de Deus, que é maior que o Porto de Suape em Pernambuco, e será uma nova alternativa portuária. Isso poderia compensar a falta de investimentos no Porto de Aratu, um dos gargalos de nossa indústria, e que há 20 anos demanda por modernização. Mas nessa área há uma boa notícia: a finalização das obras do novo cais do Porto de Salvador que, juntamente com o Porto de Paranaguá, terá o maior berço portuário do país, e representa uma enorme vantagem competitiva para a indústria baiana. O terminal portuário de Salvador é o único do país que possui uma linha expressa ligando sua retro área diretamente ao canal rodoviário e seu cais terá agora 800 metros, podendo receber dois grandes navios ao mesmo tempo e, principalmente, os monumentais cargueiros da China, destino de 30% das nossas exportações.
Outro desafio está na definição da venda da participação acionária da Petrobras na Braskem, com a provável entrada de um novo player petroquímico. E o setor ficará mais competitivo com o avanço, semana passada, das negociações entre Braskem e Petrobras para celebração de um novo contrato de fornecimento de nafta e com o crescente uso do gás pela Braskem. Além disso, a entrada em operação, prevista para este ano, da Fafen – Fábrica de Fertilizante Nitrogenados, em Camaçari, pode se constituir em elemento dinamizador da indústria petroquímica por sua ligação com o agronegócio que pouco foi afetado pela pandemia. Ou seja, quando a pandemia passar, as perspectivas para a indústria baiana são boas, embora ainda existam grandes desafios.
O maior deles é a necessidade de aprofundar e diversificar o perfil industrial do estado e, nesse sentido, as perspectivas de ramos como o de bebidas, beneficiamento da produção agrícola, metalurgia e outros são alvissareiras. Assim como o anúncio do Ministro da Infraestrutura de agilizar a concessão e a conclusão da Ferrovia Oeste-Leste, o que implica na construção do Porto Sul e pode estabelecer um novo vetor industrial para o Estado. Ao mesmo tempo, permanece o desafio de verticalizar a produção de empresas como a Bayer e a Braskem e de tentar atrair empresas para ampliar o complexo automobilístico da Bahia.
Outros desafios surgem para a indústria baiana, pois, além da necessidade de diversificar a base produtiva industrial e de estabelecer uma política industrial para Salvador – um dos 20 polos industriais do país, embora ninguém se dê conta disso – é imperativo aumentar seu conteúdo tecnológico e estimular as startups. Aqui, a Bahia tem enorme uma vantagem competitiva, dado pelo Senai/Cimatec, um centro de tecnologia e inovação dos mais modernos do mundo.(Veja aqui)
Cabe, por fim, lembrar que o atual momento é de precaução, pois ainda estamos no meio da tempestade, mas não vamos estimular o pessimismo: a pandemia vai passar e, como bem demonstra a China, cuja economia já está a pleno vapor, a indústria vai retomar seu caminho e já há perspectivas de reabertura de fábricas e do comércio em algumas cidades. Apesar da pandemia, e das agruras que o empresariado vai enfrentar para poder recompor suas empresas, a indústria baiana tem futuro.
Armando Avena é escritor, jornalista e economista. Membro da Academia de Letras da Bahia é doutor em Ciências Sociais e Professor da UFBA. Foi Secretário de Planejamento do Estado e Presidente da Fundação CPE.