O Supremo Tribunal Federal (STF) deve decidir nesta quarta-feira (18) se é crime deixar de pagar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) já declarado. Ao todo, nove ministros já votaram, dos quais seis a favor de tornar a prática crime, e três, contra. Faltam os votos de Celso de Mello e Dias Toffoli. Os seis ministros que formaram a maioria consideraram que a dívida declarada, mas não paga por empresários, pode implicar processo criminal por apropriação indébita, com pena de detenção de seis meses a dois anos e multa. Todos os seis entenderam que é preciso ser comprovado o dolo, isto é, a intenção deliberada de não pagar o tributo.
O ICMS é um imposto estadual que incide sobre operações como compra de mercadorias (alimentos, eletrodomésticos, bebidas etc.) e está embutido no preço. O Supremo discute se é crime declarar o recolhimento do imposto e não repassar os valores tesouro estadual ou se se trata de uma inadimplência. Segundo dados encaminhados ao STF, em 2018, a dívida declarada e não paga de ICMS em 22 estados era de mais de R$ 12 bilhões. Tribunais no país têm tomado decisões divergentes sobre a possibilidade de condenação criminal dos devedores. Por ser declarada, a dívida não conta como sonegação. Por isso, estados começaram a entrar na Justiça pedindo condenações. A decisão do Supremo não deve ser obrigatória, mas deve servir de orientação para que as demais instâncias da Justiça analisem os casos.
O que dizem os empresários
Empresários têm criticado o entendimento da maioria dos ministros até agora, afirmando que essa tese pode criminalizar a atividade empresarial no país. Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou que acompanha, com preocupação, o julgamento. “Trata-se de uma avaliação despropositada. O fato de a empresa deixar de pagar os tributos não significa, na grande maioria dos casos, fraude, omissão ou falsidade nas informações prestadas ao Fisco. Significa que a empresa enfrenta dificuldades financeiras para fazer os pagamentos”, diz o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade.
Também em nota, Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), afirma que considera “equivocadas e temerárias” as recentes decisões judiciais que consideram o não recolhimento de ICMS no prazo como crime passível de prisão. “O STF deve endossar mais uma dessas modalidades absurdas do Estado, afastando a liberdade dos indivíduos e a própria vedação constitucional de prisão por dívida”, afirma Yuri Sahione, advogado da área penal e compliance, professor da pós-graduação da FGV-Rio, FGV Management, UERJ e do CEU Law School.
Argumentos dos ministros que votaram a favor
Saiba os argumentos de alguns dos ministros que votaram a favor da criminalização:
Luís Roberto Barroso (relator): afirmou que crimes tributários não podem ser considerados “de pouca importância”. Relator do caso, ele afirmou que esses crimes “privam o Estado brasileiro de recursos necessários para acudir as demandas da sociedade”. “Se o sujeito furtar uma caixa de sabão em pó no supermercado o direito penal é severo. Penso que quando há crime tributário deve ser igualmente sério. Tratar diferente furto da sonegação dolosa faz parte da seletividade do dinheiro brasileiro que considera que crime de pobre é mais grave do que crime de rico”, disse o ministro ao votar pela possibilidade de criminalizar a dívida. Para o relator, no entanto, é “imprescindível” que se demonstre a intenção de não pagar. “Se for capaz de demonstrar insolvência, não há dolo, por exemplo”, afirmou.
Luiz Fux: Segundo o ministro, números mostram que o prejuízo com a sonegação é maior do que a corrupção no país. Além disso, disse que empresas milionárias são devedoras. “Temos dificuldade relativa a necessidade de fundos para viabilizar o estado a atender essa promessa constitucional, direitos básicos, educação. Isso decorre da corrupção, vimos no mensalão, depois no petrolão, mas também por força da sonegação”, afirmou.
Edson Fachin: Afirmou que a punição não ocorrerá pelo simples não recolhimento do tributo e caberá a cada juiz avaliar as hipóteses em que houve intenção de não arcar com as dívidas caso a caso. “A ausência de pagamento não denota apenas e tão somente inadimplemento, mas sim, disposição de recursos de terceiros, aproximando-se de uma espécie de apropriação tributária, aspecto que a meu ver fulmina o cerne das teses defensivas”, disse.
Entenda o caso em julgamento
No recurso julgado, um casal de contribuintes de Santa Catarina alega ter sido alvo de ação penal. Para o relator, ministro Luís Roberto Barroso, a dívida poderia ser criminalizada se o devedor for considerado contumaz e agir com dolo.