Essa pressão de parte dos líderes europeus contra o Brasil por causa do aumento das queimadas pode acabar prejudicando o nosso agronegócio. O incêndio ameaça quilômetros de floresta nativa e anos de negociações nas mesas do comércio internacional. Em jogo fica o maior acordo de livre comércio dos últimos anos do Brasil, via Mercosul, com a União Europeia, assinado no início de julho.
“O Brasil corre o risco de ver os seus produtos agrícolas sendo taxados no mundo desenvolvido como os produtos responsáveis pela destruição da Amazônia, pela destruição ambiental. O principal prejudicado é o exportador brasileiro e, principalmente, o agroexportador brasileiro, que tinha ganhado o passe para entrar no mercado de US$ 11 trilhões e agora está vendo isso sendo colocado em risco”, disse o Eduardo Mello, professor de Relações Internacionais da FGV.
Na Europa, os países que mais vão sentir o impacto do acordo comercial com o Mercosul são os produtores de alimentos, a França, em primeiro lugar. Os franceses são grandes concorrentes do Brasil na produção de soja, leite e derivados e têm um setor agrícola muito subsidiado de pequenos produtores que exportam para a Europa e para o mundo. A Irlanda é um grande produtor de carne que também vê o acordo como uma ameaça.
“O que nós temos nesse acordo é uma troca bastante sensível de abrir o mercado brasileiro para produtos industriais europeus em troca de que o mercado europeu abra suas portas um pouco mais para o agronegócio brasileiro. Isto assustou especialmente a dois países: França e Irlanda. O resultado já está presente em que eles aproveitaram a questão da janela de oportunidade, a sequência dos nossos erros no desmatamento, para colocar um obstáculo político ao que era um acordo comercial”, afirmou Leonardo Trevisan, professor de relações internacionais da ESPM.
Para o diplomata e ex-ministro do Meio Ambiente Rubens Ricupero, esta é a maior crise de relações internacionais do Brasil em 50 anos, mas que ainda pode ser contornada. “Provavelmente o que vai acontecer não é que eles cancelem o acordo. Eles vão deixar em banho-maria. Não vão ratificar, não vão levar isso avante se não houver no Brasil uma mudança efetiva, uma mudança não só de discurso, mas de medidas de ação. Houve uma série de ações que deram o sinal verde a quem? Aos grileiros, aos pecuaristas ilegais, aos madeireiros que invadem terras indígenas, aos garimpeiros que fazem a mesma coisa. Então, é um conjunto de ações do governo brasileiro que criou uma crise inútil”.