Não sei a origem da expressão acima, mas deve ser de lá das terras do meu sertão, onde a luz do sol é muito forte e a peneira, fabricada com palhas de ouricuri serve, entre outras coisas, para separar os grãos finos da farinha dos de maior dimensão, ou para catação do milho e do feijão, apartando-os de suas palhas ao sopro do vento, depois de secos ao sol. A peneira ganhou o mundo com a música Farinhada, de Luiz Gonzaga, no verso “Tava na peneira eu tava peneirando, Eu tava num namoro eu tava namorando”.
A expressão é usada quando se quer esconder alguma coisa com uma medida que não resolve o problema por completo, ou mesmo quando se adia uma solução definitiva de uma questão não resolvida e não se encontra uma saída saneadora terminante. O tapar o sol com a peneira muitas vezes faz o percalço crescer, criando dificuldades de maior monta, de solução mais difícil no futuro, quando não impossível.
No dia a dia do brasileiro, muito comum quando o mês continua depois do fim do salário, os raios do sol costumam ser pujantes em várias situações, nada escondendo. Se a dívida do cartão de crédito é parcelada, com as taxas de juros estratosféricas do mercado, por exemplo, aí é que a dívida fica a descoberto. O devedor entra numa enroscada dura de sair. Se ele pega dinheiro emprestado do agiota, pior ainda, não consegue desgrudar do malfeitor nunca mais. Entrar no cheque especial do banco para sanear um débito de uma compra mal planejada, parece ter solucionado o deslize, mas termina levando-o para um fosso maior ainda.
As coisas malfeitas costumam ser descobertas. Um ladrão começa a roubar escondido. Com o tempo ele se acostuma e passa a roubar na frente de todo mundo, aí vem a polícia e o prende. O lava-jato está cheio de exemplos desse caso. Uma gravidez mal planejada, muitas vezes acometida às escondidas, não adianta ser camuflada, o tempo se encarrega de revelar para todo mundo. Uma mentira mal contada, mesmo se repetida várias vezes como se verdade fosse, termina sendo descoberta. Se o povo é a vítima, aí então, pode esperar que a conta vai chegar, a cobrança pode tardar, mais não falha.
São inúmeros os exemplos de soluções ditas paliativas nas operações industriais de manutenção, nos processos de produção de bens com emprego de matérias primas mal especificadas, aquisição de tecnologias não testadas em escala industrial, lançamento de produtos no mercado mal dimensionado, desconhecimento do potencial dos concorrentes, uso de informações incorretas, que conduzem empresários para caminhos intrincados de um labirinto de saída inexistente.
Assim como na administração privada, na administração pública costuma-se querer tapar o sol com a peneira, pensando que se está tomando uma providência inteligente, quando não está. Procede-se assim quando se tenta cobrir um déficit orçamentário antecipando-se uma receita futura, adiando a mostra do buraco para mais adiante. Num outro caso, demite-se funcionários para suavizar a folha, agravando-se o problema do desemprego. O funcionário demitido, sem recursos, passa gastar menos, reduzindo os impostos arrecadados. Se ele se encosta num parente, pior ainda, o parente passa a poupar menos agravando a situação. E por aí vai.
Num momento de crise, quando as coisas ficam difíceis para todo o mundo, deve-se procurar uma solução que melhore a vida de todos. Não é o salve-se quem puder que vai tirar a sociedade da dificuldade. Os custos da classe produtora, formada por patrões e empregados, devem ser reduzidos. Os impostos não devem ser majorados e a produção de bens e serviços deve acomodar-se em situação de equilíbrio.
Na democracia, não é suficiente declarar-se democrata, é preciso praticar a democracia, ou seja, aceitar o desejo e a vontade da maioria. Não se deve nunca esconder o mal feito e sim definir novos rumos, com trabalho, dedicação e cedendo os espaços que estão sendo mal-usados, principalmente quando privilegiam uma minoria que insiste em ser dominante. Não se pode tapar o sol com a peneira.
Adary Oliveira é presidente da Associação Comercial da Bahia – [email protected]