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MERCADO DE TRABALHO COMEÇA A SE PREPARAR PARA OS TRABALHADORES CENTENÁRIOS

Redação - 03/09/2018 13:00 - Atualizado 03/09/2018

“Entre as idades de 100 e 105, eu publiquei quatro artigos”, diz o idoso sentado na minha frente. Agora, aos 106 anos, Bill Frankland é provavelmente o médico mais velho em atividade no planeta. Embora eu o tenha encontrado numa manhã ensolarada de sábado, ele estava feliz em seu escritório em Londres, vestido de terno e gravata, cercado por um mar de artigos.

Frankland se formou em Medicina nos anos de 1930. Durante sua longa e ilustre carreira, ele se tornou a maior autoridade do mundo em alergia. Ele trabalhou com o ganhador do Prêmio Nobel Alexander Fleming, que descobriu o antibiótico, e foi chamado uma vez ao Iraque para tratar o ditador Saddam Hussein.

Embora as regras da época exigissem que Frankland se aposentasse oficialmente aos 65 anos, ele não planejava parar de trabalhar e tem atuado como voluntário desde então. “O que mais eu faria?”, explica. Seu último projeto será divulgado em breve. “Eu precisava escrever outro artigo aos 106. E, na verdade, já foi rabiscado. Está mais ou menos pronto”.

Não é preciso dizer que a atitude de Frankland é pouco usual. A maioria das pessoas imagina seus últimos anos de vida como umas férias estendidas – uma chance de trocar cadeiras de escritório por poltronas e de começar a tirar as sonecas da tarde. Mas provavelmente não será assim que as coisas funcionarão no futuro.

Há uma lacuna considerável entre a quanto a maioria de nós terá para a aposentadoria e quanto dinheiro de fato precisaremos. E isso cresce a cada dia. De acordo com um relatório recente do Fórum Econômico Mundial, as pessoas vivendo em uma das maiores economias do mundo – como EUA, Reino Unido, Japão, Holanda, Canadá, Austrália, China e Índia – coletivamente enfrentarão um desagradável rombo de US$ 428 trilhões (R$ 1,6 quatrilhão) na poupança em 2050.

Enquanto isso, a população global envelhece. Em 2015, havia cerca de 451 mil centenários, e esse número deve ser oito vezes maior nas próximas três décadas. Nos EUA, eles são o grupo etário que cresce mais rapidamente. No Reino Unido, há agora tantos centenários que a Rainha Elizabeth 2ª contratou uma equipe extra para enviar-lhes cartões de aniversário quando chegarem aos 100. Na realidade, a maioria das crianças nascidas em países ricos hoje tem a expectativa de celebrar o centésimo aniversário.

Isso é parte do problema. Até nos EUA dos anos 1960, mais de duas décadas depois que as aposentadorias públicas foram introduzidas, as pessoas geralmente só conseguiam aproveitar o benefício por cerca de cinco anos – já que a idade de aposentadoria era em média 65 anos, e a expectativa de vida beirava os 70.

A resposta para a primeira pergunta pode surpreender. Ao redor do globo, da Califórnia à Polônia até a Índia, os centenários já trabalham duro. E parece que nenhuma profissão está fora de cena. Há muitas para listar, mas elas incluem barbeiros como Anthony Mancinelli, que tem cortado cabelo há 95 anos (ele começou em 1923, aos 12 anos); atletas como Stanislaw Kowalski, que quebrou o recorde mundial por correr cem metros aos 104 anos; e estrelas do YouTube, entre elas Mastanamma, uma bisavó de 107 anos que ensina milhões de seguidores a preparar, por exemplo, ovo frito de ema.

Aliás, há pessoas mais velhas que querem trabalhar. É o caso de Peter Knight, empreendedor do Reino Unido. Há quatro anos, criou a empresa de recrutamento Forties People, especializada em contratar pessoas mais experientes. “Não há limite de idade. Já tivemos um cliente com 82 anos, e o seu empregado mais velho tinha 94”, conta.

O homem de 94 anos se aposentara três vezes na mesma empresa, que cuida dos registros da Marinha britânica – mas toda vez ele voltava ao escritório para encontrar com os colegas. Ele começava a ajudar, e uma coisa levava à outra, até que começaram a pagar-lhe uma pequena quantia para que transitasse pelo local. “Ele era parte da mobília”.

Já alguns empregos são simplesmente bons demais para se largar. O apresentador de TV britânico Sir David Attenborough, de 92 anos, que apresenta programas sobre a vida selvagem na BBC, está confiante de que chegará aos 100 – e já disse várias vezes que não tem planos de se aposentar. Afinal quem se aposentaria se o trabalho envolvesse brincar com preguiças ou bebês gorilas?

“Não temos uma idade de aposentadoria compulsória no Reino Unido. No setor de educação superior, há pessoas que continuam a dar aulas aos 70 anos”, diz Jane Falkingham, gerontologista e diretora do Centro de Mudança Populacional na Universidade de Southampton. “Acho que o professor mais velho que temos na faculdade está em meados dos 70. Mas claro que a academia tem um vida relativamente boa”.

Para Frankland, continuar a trabalhar foi uma decisão prática – mesmo que ele seja claramente apaixonado por seu trabalho. “Eu era uma jardineiro obcecado, mas agora eu não consigo”, diz. “Todas as coisas que costumava fazer, aos 106 anos, não consigo fazer mais. Então, o que me resta? Eu leio bastante, principalmente coisas científicas, em vez de romances ou coisas parecidas”.

Em Forties People, não há um padrão de trabalho, embora a maioria seja de escritório. “Tivemos três companhias de imprensa ligando para nós há poucas semanas”, conta. Depois de tentar recrutar recepcionistas e equipes de RH mais jovens e não considerá-las confiáveis, eles decidiram buscar trabalhadores mais velhos que priorizassem seus empregos.

Para pessoas em atividades com maior exigência física, continuar a trabalhar é mais desafiador. Mas nem sempre esse é o caso. “A tecnologia está mudando a forma de trabalho”, diz Falkingham. “As atividades manuais e pesadas estão sendo feitas por máquinas. A natureza do trabalho está mudando, o que vai facilitar que as pessoas trabalhem por mais tempo”.

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